Pena que pena que coisa bonita... E,
ainda assim, acaba. Quando um casal de amigos se separa - um casal daqueles que
a gente conheceu sempre junto, feito o diagrama de Tai Chi, o yin e o yang em
harmonia inteireza -. A gente fica de boca aberta. É duro e doloroso; não
acreditamos, não queremos, perguntamos feito filhos órfãos: “Como assim? Eles
nem me perguntaram nada? Foram feitos uma para o outro, viveram a vida inteira
juntos, como podem agora se separar?” E, ainda assim, a vida segue, o rio
transcorre, a ampulheta chia, o tempo realiza seu trabalho de juntar e separar;
separar e juntar. E então a gente vai a um evento perto de casa e, pela
primeira vez, encontra seu Rogê sozinho, sem Dona Ju. Difícil pensar que eles
se conheceram durante a jovem guarda, velhos tempos, belos dias... Difícil crer
que atravessaram mais de trinta anos juntos e, agora, no início do inverno,
cada um foi para o seu lado; procurar outro caminho, enfrentar a neve e a
viagem derradeira em outra cama. É triste imaginar Dona Ju olhando a chuva sozinha,
bebendo chá em cadeira de madeira e balanço. É duro imaginar seu Rogê, menino
envelhecido, compondo poemas para a ausência de sua metade. Quem é que pode
imaginar Akira sem Sueli, ou Éder sem Ligia? É estranho ver um deles sem o
outro por perto... Sensação de círculo incompleto... No último sarau, aqui na
periferia onde moramos, vi seu Rogê inseguro, sozinho, não cabendo muito no
mundo. Ele que sempre foi tão alegre, que bebia e cantava e recitava poemas de
amor. Como é que um homem de setenta anos pode se perder assim? Num determinado
momento, alguém puxou uma canção triste e eu vi seu Rogê suspirar e passar a
mão cansada sobre os cabelos escassos e brancos. Pensava quem sabe na menina
travessa que ele um dia amou e que vivia agora em outra placa tectônica, num
Universo paralelo, tão distante da vida que viveram juntos. Eles se amaram de
qualquer maneira à vera. Qualquer maneira de amor vale à pena e quando acaba,
se acaba, não termina, torna-se parte da nossa travessia: esfera rompida que
ainda guarda nas bordas o encaixe da outra parte.
Este
post é o diálogo entre a imagem feita por mim (Fernando) e a narrativa que ela
suscitou no escritor Daniel Lopes Guaccaluz.
1 Comentário
Que coisa mais linda isso de "habitar outra placa tectônica"! Sensível, singelo... Oh texto meigo de melancólico... Chorei aqui. Foi bom não...
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