terça-feira, 17 de julho de 2018

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Pequenas histórias 283

Tenho a impressão

 

Tenho a impressão de não sei o que poderá ou não acontecer.
É uma impressão instantânea de coisas sumidas e não desaparecidas.
É algo que solidifica o pensamento em diversas direções sem sentido.
Algo que fica aqui e vai além dessa sexta-feira – até que fim sexta! – nublada de primavera.
Primavera com chuva e catástrofe sem limite.

Culpado o ser humano luta com todas as forças dos seus genes pela sobrevivência.
Culpado por seus semelhantes mortos em esteiras de barro e lama e em UTIs da vida.
Santa Catarina chora os mortos na voz empostada pelo padrão Globo de noticias.
Chora milênios de vidas sobre lama suja e podre de morte nos morros e casas destruídas.

Mas... Sempre tem um, mas... Não é?
Mas é Natal festa sorriso alegria presentes abraços e música, muita música e chope
Muito chope na falsa preocupação de todos os dias.

“Parabéns para você nesta data querida...”

Come-se e bebe-se pelo Teu nascimento já morto na esquecida cruz.
Bebe-se a alegria dos vivos zumbis de suas próprias mortes no solo das tristezas.
Degustemos sorrisos largos de felicidades de um dia somente.

Desculpe Santa Catarina.
Desculpe Marta* querida.

Mas é Natal precisamos nos jubilar com o nascimento daquele que morreu para nos salvar.
Apesar de que muitos não querem a salvação como eu também não quero.
Quem se salva não tem vida, já está pronto para a luz eterna.
Não quero me salvar, quero continuar pecador banhando-me no sangue de todos os pecados.
Sem salvação andarei na chuva ácida até que meus ossos se desfaçam em pó.
Palmilharei tecidos ejaculados em peles distorcidas pelo prazer da fome suicida.
Ouvirei gritos na quietude do solo encharcado de sêmen destruído na chuva intermitente.
Não chorarei, não sei chorar, secaram as lágrimas do meu corpo seco e entorpecido.

Desculpem-me os sentimentais, a vida ocorre a cada suspiro da alma
A vida se suplanta a alma entristecida de seus irmãos violentada pela natureza.
Envolvo-me na fímbria dos socorros esgotando minha força de solidário cidadão.
Sou a chuva que desaba encostas
Sou as encostas desabrigadas
Por isso não choro
Vivo os instantes de calamidades
Vivo os sofridos soterrados

Mas, tem sempre um, mas, não é?

Pois é,
Mas é Natal
É sorriso estampado na alma da cidade
Na alegoria da felicidade esbanjando enfeites sonoros
É Natal

Desculpe Marta querida
Desculpe Santa Catarina sofrida

Tenho no acontecer meu sorriso festivo
Tenho nos abraços amigos os inimigos
Nos beijos frios e displicentes
A paz de um minuto de felicidade conseguida

Portanto
Desculpe Marta amiga
Desculpe Santa Catarina

Vivo para sentir o que ainda não senti


Pastorelli

*Marta, companheira amiga de trabalho, falecida na madrugada de 28.11

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