a actriz avança no nevoeiro que se levanta
traz a sua luz de glória perde-se no “não
se paga. não se paga”, avança como um navio
no cais, grande e leve para navegar do guincho
ao ginjal. a actriz viaja no meu país de
remendos e de pedras , meu país sem água
e sem sede e sem fé – tudo dorme na flor
da inveja e do ciúme, o país não pode produzir
a beleza nem a sua dor fina. dobra irmão o bico
publico, à claridade imunda dos parasitas
mediáticos da verdade absoluta. “deve ser assim”!
"assim não”.todos se sentam no seu banquinho de
excelências e vinho. meu país indeferido e infinito
que levanta a poeira para lá da língua de todo o
mundo. e nada. sintra é maravilhoso na primavera.
como o Algarve
a actriz morreu
no total desprezo ela ainda avança no palco dos
que ficam, pequenos navios ao largo do tejo
barcaças, . se eles andam eu já vou neles
adeus amigos, pátria dos amigos, enfia-me
a faca pelas costas como uma ousadia contra o
esquecimento. avanço já nos ribeiros do meu amor
pequenino, vê como voo na pátria doente da erva
daninha e dos cigarros amarelos
a casa abandonada para novos esquecimentos
esqueço-me de mim no navio que deixa lisboa, a capital
o sol nasce ainda devagar chega a actriz do “não se pode
extermina-lo” meu país ao pé do intermarché, os passeios
cheios de carros e de cegos. bonita é a fuzeta, partiu-se o
aduelo, a moldura da porta aberta.
não sou escravo do poema. trabalho - o há três anos
no dia em que sobra o pão a floresta da esteva
a flor da estepe, o teu figo, pela flor de cada
fruto meio fechado basta-me a flor do teu mamilo
adoro a minha pátria dos artistas doces e das
cobras – compõe casas simples e pequeninas
o milagre da pátria está para lá da alma certa
entra josé
sai josé
o tempo avança
José Gil
Imagem: Vincent Teuliere
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