quarta-feira, 3 de novembro de 2010

0

Esquecimento - José Gil




































a actriz avança no nevoeiro que se levanta

traz a sua luz de glória perde-se no “não

se paga. não se paga”, avança como um navio

no cais, grande e leve para navegar do guincho

ao ginjal. a actriz viaja no meu país de

remendos e de pedras , meu país sem água

e sem sede e sem fé – tudo dorme na flor

da inveja e do ciúme, o país não pode produzir

a beleza nem a sua dor fina. dobra irmão o bico

publico, à claridade imunda dos parasitas

mediáticos da verdade absoluta. “deve ser assim”!

"assim não”.todos se sentam no seu banquinho de

excelências e vinho. meu país indeferido e infinito

que levanta a poeira para lá da língua de todo o

mundo. e nada. sintra é maravilhoso na primavera.

como o Algarve



a actriz morreu

no total desprezo ela ainda avança no palco dos

que ficam, pequenos navios ao largo do tejo

barcaças, . se eles andam eu já vou neles

adeus amigos, pátria dos amigos, enfia-me

a faca pelas costas como uma ousadia contra o

esquecimento. avanço já nos ribeiros do meu amor

pequenino, vê como voo na pátria doente da erva

daninha e dos cigarros amarelos



a casa abandonada para novos esquecimentos



esqueço-me de mim no navio que deixa lisboa, a capital

o sol nasce ainda devagar chega a actriz do “não se pode

extermina-lo” meu país ao pé do intermarché, os passeios

cheios de carros e de cegos. bonita é a fuzeta, partiu-se o

aduelo, a moldura da porta aberta.



não sou escravo do poema. trabalho - o há três anos

no dia em que sobra o pão a floresta da esteva

a flor da estepe, o teu figo, pela flor de cada

fruto meio fechado basta-me a flor do teu mamilo

adoro a minha pátria dos artistas doces e das

cobras – compõe casas simples e pequeninas

o milagre da pátria está para lá da alma certa

entra josé

sai josé

o tempo avança


José Gil




Imagem: Vincent Teuliere

Seja o primeiro a comentar: