terça-feira, 21 de dezembro de 2010

2

O lago

CONTOS DE SOLIDÃO


O lago

Sônia Pillon


A cabeça de Norton lateja tanto que parece que vai estourar. Suas mãos tremem e seu olhar
está perdido no infinito. Mil imagens aparecem e desaparecem em sua mente. O coração parece
que vai saltar pela boca, de tanto que ele correu aquela noite. A camisa está ensopada de suor, e as idéias estão desconexas.
A noite escura é aliada da sua fuga, e o parque parece ser o lugar ideal para colocar a cabeça no lugar. Naquele momento, o lago de águas serenas apareceu como um bálsamo.
Foi então que Norton decidiu sentar à beira do lago para entender o que aconteceu. Como tinha sido capaz de tanta insanidade? Como pode perder o controle de si mesmo?
Lágrimas copiosas começam a cair. Sacudido pelos soluços, o jovem esconde o rosto entre as mãos e fala baixinho, como a sussurar para si mesmo: E agora?!...
A noite pareceu interminável para ele, até que a luz do dia iniciou timidamente o lento desvendar da escuridão. tornando as formas mais nítidas, e o lago ainda mais azul.
O parque pouco a pouco descortina seus habitantes, de mendigos e andarilhos, que parecem se assustar com a chegada dos raios solares. Alguns ainda dormem, sucumbidos pelo sono, ou pela cachaça da noite anterior. Outros se esforçam para levantar, e, ainda trôpegos, procuram com dificuldade coordenar as pernas.
Nenhum dos excluídos parece se importar com a presença de Norton, que permanece sentado em frente ao lago, olhando para o nada. As profundas olheiras denunciam uma noite em claro, que nem por isso ajudaram a clarear suas ideias...
Ainda lembra do olhar incrédulo da mulher quando ele disparou quatro tiros à queima-roupa no seu peito, dos gritos de dor e desespero, do pedido em vão de socorro. Mas o sítio era um lugar isolado, não tinha como alguém ouvir alguma coisa. Ele pensara em tudo!...
- O que é que eu fiz?! O que é que eu fiz?!, se perguntava, enquanto soluçava e suas mãos pareciam querer arrancar os próprios cabelos, completamente transtornado.
Depois de pouco mais de uma hora, num pulo, Norton se levanta e olha o lago como se fosse pela primeira vez. Consegue ver os peixes no fundo, as plantas aquáticas, e aquele azul profundo, que parecia hipnotizá-lo.
Foi quando ele começou lentamente a entrar na água, sem se importar que estava afundando mais e mais, até desaparecer por completo.

Sônia Pillon é jornalista e escritora. Nascida em Porto Alegre (RS), está há 14 anos radicada em Jaraguá do Sul (SC).

2 comentários

jorge vicente

solidão... solidão...

e morreram duas pessoas...

você me consegue comover, amiga :)

SÔNIA PILLON

Obrigada, Jorge, mais uma vez!...
Infelizmente, a solidão não inspira somente poetas, escritores, e faz amadurecer... Quando mal administrada, a solidão, e a incompreensão, tambem pode resultar em tragédias...