quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

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O ANJO – CAPÍTULO 13



- Nem sempre as palavras são pétalas de esclarecimento, Ângelo. Podem ser belas, mas equívocas, transpassadas. Por que insistimos nelas com tanto vigor? Por que, ainda que movidos no cordão inconsciente, desabamos com tanta nitidez por sobre este traçado consciente, regrado à régua, leis, transversais?
- Porque desabados nos limites incondicionais da matéria precisamos aprendê-la, sugá-la. Visualizar seu traçado, bebermos de sua energia e movimento e, ainda que derivados dela, a ultrapassarmos. Então os conceitos, as racionalizações, abstrações e generalizações escolhem essas ondas básicas, o som, e falamos.
- Medo...
- Uma força motriz. Existe um sabor de veneno e outro de alegria nessa secura do conhecimento, da ciência. Uma vitória venal, mas grandiosa, porque é nosso cérebro imprimindo seu registro, não apenas deslumbrando-se com a criação. Se os poetas foram calados é porque não estavam sozinhos, embora encantadores de serpentes, também se deliciam com as esquisitices cotidianas, com a longa e impotente entropia do coro das trevas, das coisas e dos seres, que não levitam, consagrados ao chão.
- É uma dicotomia inventada em primeira instancia, pois a práxis ou esse ritual de vida se desenrolando nas necessidades e nos sonhos, na luta e nas vagas do éter é una, reflexo de um mesmo movimento cósmico, em expansão e à deriva, ao alto e prensado em sua própria exuberância.
- Bem, creio que sim, pelo menos me falham os argumentos para te contradizer. Mas, sempre tenho em mente não a cor do dia, antes a vadiagem da areia. Minha ação não termina com o findar do meu tempo, forma-se e conforma-se nos dias, no tempero da fonte, em sua agonia, para o seu amor. Você sabe que principalmente me contento em ser e sou um poente amanhecido, acordado na praia pela travessura das crianças, presto ao banquete dos Anjos, ao florescer de alguma flor.
- Sou bravata e desvio, pálida e presta das fontes sussurradas em meio a um mato alto e certeiro, enviada ao enviado dos deuses para exigir ao povo uma pétala de amor.
- Às vezes, em minhas noites brancas, sem faíscas e fábulas, enamoro-me desse teu corpo requebrado e insólito, insulto de tantas defesas, destemido em suas vontades.
- Talvez me aquiete esse peito rijo de tanta dor, amolecido de tanto fervor. Desenharei em meu ancorado livro de fatos o teu esplendor e, ainda, não me conformarei. Continuarei a enfeitar a terra, a gritar pelas estrelas púrpuras do pudor, a adormecer no regato das linhas curvas, pasto do silêncio e espera.
      Naquele dia amaram-se amassados em um único grito. Nenhum descompasso procurou-os, no prado o vagido da vertente. Escorados, fortaleceram-se e, no dia, foram abraçados por um pedaço de noite, veloz, estrelado, estriado e vácuo, consciente, possuído dos tenros da terra, amanhecido em suas luas. 

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