Noite alta, João ouviu um barulho na sala. Levantou e foi ver. Um ladrão, claro, o que mais poderia ser àquela hora?
— A TV é novinha — falou João. — O senhor vai gostar.
— Pesada, né? Pode me dar uma ajudinha aqui?
João ajudou o ladrão a carregar a TV até uma caminhonete que estava parada lá fora. Era pesada mesmo, muita coisa prum homem só.
— O que mais tem de bom aí?
— DVD player importado. Serve?
— Serve. O que mais?
— Aparelho de som. MP3. Dos bons.
— Dinheiro?
— Bastante. Quanto o senhor quer?
— Quero tudo.
— Perfeitamente. Real e dólar?
— Tem libra? Euro?
— Sinto muito. Troquei ontem.
— E jóias?
— Uma fortuna em jóias.
Mais uma vez João ajudou o homem a levar as coisas para a caminhonete. Voltaram sorrindo.
— Se todos fossem iguais a você — falou o ladrão — o meu trabalho seria bem mais fácil.
— É um trabalho duro, eu compreendo — falou João. — Trabalhar por conta, sem registro nem nada, sem sindicato, como é que pode?
— Mas já estamos nos organizando.
— O crime organizado. Muito moderno.
— É isso aí.
— O senhor quer mais alguma coisa?
— A sua esposa, ela tá aqui?
— Tá dormindo.
— É gostosa?
— Descubra o senhor mesmo. Fique à vontade.
O ladrão entrou no quarto. Voltou dez minutos depois com um relógio na mão.
— Olha só o que eu achei!
— É todo seu. Gostou dela?
— Um pouco. Ela é meio ausente.
— Sempre foi assim. Sinto muito.
— Tudo isso me deu fome. Tem alguma coisa pra comer?
— Vou preparar. Quer cerveja?
— Tem holandesa?
— Só da Dinamarca. Vai?
— Tá bom, tá bom, vai essa mesmo.
O ladrão comeu, bebeu uma dúzia de cervejas.
— Satisfeito?
— Muito — respondeu o ladrão. E arrotou.
— Não faça barulho! — advertiu João. — Podem chamar a polícia.
— Desculpe.
— Não foi nada, mas é bom se cuidar. Vizinhos são tagarelas.
— Sempre são.
— Bem, acho que eu não posso lhe oferecer mais nada.
— Pode sim – falou o ladrão.
— O que mais o senhor quer?
— Você.
— Eu? Acho que o senhor não vai gostar. Sou muito magro.
— Assim é mais gostoso.
O dia estava amanhecendo quando o ladrão resolveu ir embora. João o acompanhou até a caminhonete.
— Espero que tudo tenha sido do seu agrado.
— Quase tudo.
— Vou fazer o possível para atendê-lo melhor da próxima vez, senhor ladrão. Recomendações minhas aos seus amigos.
— Não tenho nenhum amigo.
— Agora tem.
Seja o primeiro a comentar:
Postar um comentário