Aldo V. saiu de casa apressado segurando na mão uma sacola de plástico abarrotada de roupas. Desceu a rua até a esquina, virou à esquerda e, com passos largos, chegou à praça. Parou um segundo, observou com desdém a coluna de concreto que ocupava todo o espaço central e, então, tornou a andar. Seus olhos procuravam uma placa que indicasse o nome da praça. Não encontraram. “Impressionante”, pensou, “mas ainda não tem nome”. Aliás, nada mais ali tinha nome. “Misteriosos são os caminhos do Homem”, pensou — e riu.
Não muito longe dali encontrou Gabriel, nu e constrangido.
— O senhor aceitaria uma folha de parreira — perguntou ele, um sorriso que misturava bondade e cinismo.
— Acho que uma folha só não vai ser suficiente — respondeu o anjo. — Creio que daqui pra frente as minhas necessidades vão ser cada vez maiores.
Aldo V. passou a sacola para o anjo.
— Aqui vai encontrar tudo o que precisa — falou. — Por ora.
Gabriel estava acostumado aos milagres, por isso não estranhou o gesto do homem.
— À qual ordem você pertence?
O homem franziu a testa.
— Ordem?
— É. À qual ordem de anjos você pertence?
Aldo pensou que algo mais faltava a Gabriel além da roupa. Mas isso não era da sua conta. A boa ação do dia fora praticada, era mais um crédito para a sua entrada no... Céu?
— Acho que isso é tudo o que posso fazer pelo senhor hoje — disse.
— O Supremo não mandou mais nada?
— Supremo?
— É, o Supremo. Não foi ele quem te mandou aqui?
Aldo olhou para o rosto de Gabriel e notou que, apesar da situação, ele estava muito bem barbeado. Notou também suas unhas, limpinhas.
— Ninguém me mandou — falou ele. — Sempre faço isso, gosto de ajudar os mendigos. Principalmente quando eles me interessam de alguma maneira.
— Mendigo? Eu sou um anjo!
— Tá bom, querido. Cadê as asinhas, então?
Gabriel lançou um olhar por sobre o próprio ombro, em vão.
— Sei. Você é um anjo. E eu sou a rainha da Inglaterra.
Antes que o anjo pudesse falar qualquer coisa, Aldo se afastou.
— Mendigo... — repetiu Gabriel, indignado.
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