A Política Linguística
«O certo é que o «mundo real» é em larga medida
inconscientemente construído a partir dos hábitos linguísticos do grupo. Não há
duas línguas que se assemelhem o bastante para representarem a mesma realidade
social. Os mundos em que as vivem as diferentes sociedades são mundos
distintos, e não simplesmente o mesmo mundo coberto de etiquetas diferentes.»
Edward Sapir
A língua organiza a experiência estando essa organização sob
influência do comportamento colectivo dos falantes. Existe uma dialéctica onde
as línguas geram diferentes sociedades e estas geram a diferença entre línguas.
Segundo Carlos Reis, «Algumas características permitem
considerar a língua como uma forma de linguagem e delas isolaremos a função
comunicativa e a convencionalidade. A língua não é apenas um conjunto de sons
produzidos pelo aparelho fonador humano e emitidos pelo autor sem intenção – a
adequação das formas dos conteúdos e aos objectivos a atingir é essencial na
construção linguística. Por outro lado, a relação entre as referidas formas e
conteúdos não é resultado de uma imposição intrínseca, «natural», mas definida
por normas, convenções estabelecidas entre os utentes»(REIS:1992; pp.33)
A língua é um poderoso meio de construção da identidade,
assim como, de exercício da nossa influência no mundo, de valorização dos
nossos recursos humanos, da economia, da política à cultura. Não existe somente
como objecto funcional para a comunicação tem influência decisiva no nosso
pensamento e nos nossos sentimentos. Mostra o nosso mundo e transportamo-nos ao
mundo do outro.
Segundo Maria Helena Mateus, “Todas as línguas constituem
formas preferenciais de identificação cultural no uso que delas faz o falante
no seu quotidiano e contribuem para a realização do indivíduo como membro de
uma comunidade. (...) Por outro lado, quando uma língua viva passa a ser menos
conhecida e menos utilizada pelas pessoas para quem não é língua materna,
perdem-se referências históricas e torna-se mais obscura a caracterização da
comunidade que a fala”
(MATEUS: 2005; pp. 6,7)
Vítor Manuel Aguiar e Silva afirma: «(...) a língua
portuguesa alcançou aquela situação[3]graças à expansão colonial levada a cabo
por Portugal desde o sec. XV e à correlativa formação de um império. Trata-se
de uma lei fundamental da vida e da evolução das línguas: uma língua
converte-se em língua internacional ou transnacional, não pelas “suas
propriedades estruturais intrínsecas”, não por estar ou ter estado associada a
uma grande cultura, não por ter sido veículo de uma prestigiosa leitura, mas
graças ao poder político, militar, económico, cultural e científico-tecnológico
do povo, do país e do Estado de que ela é língua nacional ou língua oficial”
(SILVA:2005, pp. 25,26).
A promoção de uma língua depende de vários factores como os
demográficos, geográficos, económicos, políticos e técnicos Para a sua difusão
têm influência factores como o número de falantes, a distribuição geográfica, o
peso económico, a supremacia política e o reconhecimento da sua cultura.
“(...) sem perder de
vista, como aconselham o realismo político e a história e a sociologia das
línguas , que a importância, o prestígio, a força e a difusão de uma língua
dependem fundamentalmente, como ficou exposto, da dimensão demográfica, do peso
geopolítico, do desenvolvimento económico e do dinamismo cultural, científico e
tecnológico dos países que a falam e que a escrevem – a esta luz, a importância
internacional da língua portuguesa, no presente e no futuro, depende obviamente
do Brasil.
-; mas sem esquecer
ou enjeitar as responsabilidades históricas –eu diria mesmo
histórico-simbólicas – que a este respeito lhe cabem.
Uma política transnacional da língua portuguesa, no âmbito
da CPLP, requer que Portugal disponha de uma política nacional e de uma
política internacional da língua portuguesa, com objectivos bem fundamentados e
definidos, com estratégias adequadas e com meios e instrumentos apropriados.
A política nacional da língua tem como vectores fundamentais
o ensino, estudos, os programas, os manuais e outros materiais
pedagógico-didácticos, o fomento da leitura, sobretudo entre as crianças e os
jovens, o apoio à edição de autores portugueses, sobretudo dos “autores
clássicos”, o estímulo à qualidade da língua utilizada nos meios da comunicação
social e o incentivo à presença da língua portuguesa no ciber-espaço”
(SILVA: 2005; pp. 30)
De acordo com Sarney(
2005; pp.52)“ O futuro da língua depende da nossa capacidade de mantê-la viva,
forte e dinâmica, num mundo onde os monopólios de comunicação, os blocos
regionais de nações, as grandes associações internacionais e a ampla
preocupação coma salvaguarda do meio ambiente começam a entremostrar um
processo de unificação massificadora, cada vez mais patente e acelerado, que,
se mal orientado, pode sufocar os menos poderosos ou menos atentos. Por isso é
tão importante realçar e divulgar para todos, mas principalmente para os que
por ele se expressam, que o Português é – nas vésperas da passagem do segundo
para o terceiro milénio – a sétima língua materna mais falada do mundo.”
Baseando-nos na posição de C. Marques Balsa, dizemos que a
não convergências de práticas não conduz a um produto comum pois não resulta na
cominação de esforços.
Os intervenientes neste processo estão divididos no campo
metodológico e, principalmente, no enquadramento da sua prática em
organizações, a quem reportam, distintas.
“ Lógica da investigação, lógica do ensino, lógica
administrativa e lógica política, podem opor-se, mesmo quando estão de acordo,
ao nível, por exemplo, da maneira como assumem, na definição dos seus
objectivos, os determinantes do tempo e do espaço da acção.”
(BALSA: 1989; pp. 44)
Segundo o mesmo autor, os investigadores gerem processos que
são, maioritariamente, viáveis a longo prazo.
A lógica administrativa funciona, de igual modo, a médio
longo prazo.
O espaço de sala de aula, para a lógica administrativa,
representa uma pequena dimensão.
As finalidades da acção escolar, através das opções
filosóficas e contextualizadas numa lógica política, apontam também para uma
gestão de longo prazo.
“Fontoura (1992) ao
descrever diacronicamente o ensino da língua portuguesa no estrangeiro
considera três fases distintas: a primeira, durante a primeira República, em
que o estado “entendia dever instrução a todos os cidadãos” (op cit:82), a
segunda, a partir de 28 de Maio de 1926 a 1974 e a terceira, a fase pós-25 de
Abril de 1974 (Fontoura (1992:82-831). Dos princípios políticos da segunda
fase, destaca-se a desresponsabilização do estado em relação à educação,
passando esta a pesar sobre a família, sendo o estado um mero cooperador. Nesta
fase distinguem-se dois períodos, designadamente de 1926 a 1960 e de 1960 a
1974, diferenciados pelo ensino dentro ou fora do espaço universitário;” de
1926 a 1960 o ensino da língua e da cultura portuguesas é promovido oficialmente
no estrangeiro pelo Instituto de Alta Cultura Portuguesas (criado em 1936)
apenas ao nível das universidades, através dos leitorados” (Fontoura (op.
Cit:82)). De 65 a 74 é estendido a espaços não universitários.” (GROSSO:1999,
pp. 61)
O objectivo de todas estas vertentes deve ser a contribuição
para a produção da acção educativa.
Cada actor deve reconhecer as especificidades de cada
posição e definir o espaço da sua acção de forma a tratar de zonas distintas
mas complementares.
Considerando-se que a língua é um dos elementos
constitutivos da identidade de um povo, a história mostra que a difusão da
mesma foi a forma mais comum de domínio entre os povos, dependendo a
implantação da língua estrangeira de diferentes conjunturas como a económica e
a político-administrativa. No entanto, o seu desenvolvimento está
intrinsecamente ligado ao uso diário da língua na comunidade, nas relações
familiares, nas tradições, manifestações culturais e na religião. O uso é um
factor fundamental para a sobrevivência da língua.
As relações relacionadas com o uso e a difusão de uma língua
podem apresentar-se, para Maria Helena Mira Mateus, numa tripla forma: “1) A
língua como forma de construção da pessoa e de comunicação quotidiana do
indivíduo, como língua materna. 2) A língua como veículo de escolarização de
comunidades que a utilizam como língua segunda. 3) A língua como referência
sócio-política e cultural nos espaços em que é língua estrangeira”
(MATEUS: 2005; pp.2)
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