quinta-feira, 1 de março de 2012

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A Política Linguística (Parte 1 de 3)


A Política Linguística

«O certo é que o «mundo real» é em larga medida inconscientemente construído a partir dos hábitos linguísticos do grupo. Não há duas línguas que se assemelhem o bastante para representarem a mesma realidade social. Os mundos em que as vivem as diferentes sociedades são mundos distintos, e não simplesmente o mesmo mundo coberto de etiquetas diferentes.»
Edward Sapir

A língua organiza a experiência estando essa organização sob influência do comportamento colectivo dos falantes. Existe uma dialéctica onde as línguas geram diferentes sociedades e estas geram a diferença entre línguas.
 
Segundo Carlos Reis, «Algumas características permitem considerar a língua como uma forma de linguagem e delas isolaremos a função comunicativa e a convencionalidade. A língua não é apenas um conjunto de sons produzidos pelo aparelho fonador humano e emitidos pelo autor sem intenção – a adequação das formas dos conteúdos e aos objectivos a atingir é essencial na construção linguística. Por outro lado, a relação entre as referidas formas e conteúdos não é resultado de uma imposição intrínseca, «natural», mas definida por normas, convenções estabelecidas entre os utentes»(REIS:1992; pp.33)
A língua é um poderoso meio de construção da identidade, assim como, de exercício da nossa influência no mundo, de valorização dos nossos recursos humanos, da economia, da política à cultura. Não existe somente como objecto funcional para a comunicação tem influência decisiva no nosso pensamento e nos nossos sentimentos. Mostra o nosso mundo e transportamo-nos ao mundo do outro.
 
Segundo Maria Helena Mateus, “Todas as línguas constituem formas preferenciais de identificação cultural no uso que delas faz o falante no seu quotidiano e contribuem para a realização do indivíduo como membro de uma comunidade. (...) Por outro lado, quando uma língua viva passa a ser menos conhecida e menos utilizada pelas pessoas para quem não é língua materna, perdem-se referências históricas e torna-se mais obscura a caracterização da comunidade que a fala”
(MATEUS: 2005; pp. 6,7)

Vítor Manuel Aguiar e Silva afirma: «(...) a língua portuguesa alcançou aquela situação[3]graças à expansão colonial levada a cabo por Portugal desde o sec. XV e à correlativa formação de um império. Trata-se de uma lei fundamental da vida e da evolução das línguas: uma língua converte-se em língua internacional ou transnacional, não pelas “suas propriedades estruturais intrínsecas”, não por estar ou ter estado associada a uma grande cultura, não por ter sido veículo de uma prestigiosa leitura, mas graças ao poder político, militar, económico, cultural e científico-tecnológico do povo, do país e do Estado de que ela é língua nacional ou língua oficial” (SILVA:2005, pp. 25,26).
A promoção de uma língua depende de vários factores como os demográficos, geográficos, económicos, políticos e técnicos Para a sua difusão têm influência factores como o número de falantes, a distribuição geográfica, o peso económico, a supremacia política e o reconhecimento da sua cultura.
  “(...) sem perder de vista, como aconselham o realismo político e a história e a sociologia das línguas , que a importância, o prestígio, a força e a difusão de uma língua dependem fundamentalmente, como ficou exposto, da dimensão demográfica, do peso geopolítico, do desenvolvimento económico e do dinamismo cultural, científico e tecnológico dos países que a falam e que a escrevem – a esta luz, a importância internacional da língua portuguesa, no presente e no futuro, depende obviamente do Brasil.
 -; mas sem esquecer ou enjeitar as responsabilidades históricas –eu diria mesmo histórico-simbólicas – que a este respeito lhe cabem.
Uma política transnacional da língua portuguesa, no âmbito da CPLP, requer que Portugal disponha de uma política nacional e de uma política internacional da língua portuguesa, com objectivos bem fundamentados e definidos, com estratégias adequadas e com meios e instrumentos apropriados.
A política nacional da língua tem como vectores fundamentais o ensino, estudos, os programas, os manuais e outros materiais pedagógico-didácticos, o fomento da leitura, sobretudo entre as crianças e os jovens, o apoio à edição de autores portugueses, sobretudo dos “autores clássicos”, o estímulo à qualidade da língua utilizada nos meios da comunicação social e o incentivo à presença da língua portuguesa no ciber-espaço”
(SILVA: 2005; pp. 30)
 De acordo com Sarney( 2005; pp.52)“ O futuro da língua depende da nossa capacidade de mantê-la viva, forte e dinâmica, num mundo onde os monopólios de comunicação, os blocos regionais de nações, as grandes associações internacionais e a ampla preocupação coma salvaguarda do meio ambiente começam a entremostrar um processo de unificação massificadora, cada vez mais patente e acelerado, que, se mal orientado, pode sufocar os menos poderosos ou menos atentos. Por isso é tão importante realçar e divulgar para todos, mas principalmente para os que por ele se expressam, que o Português é – nas vésperas da passagem do segundo para o terceiro milénio – a sétima língua materna mais falada do mundo.”


Baseando-nos na posição de C. Marques Balsa, dizemos que a não convergências de práticas não conduz a um produto comum pois não resulta na cominação de esforços. 
Os intervenientes neste processo estão divididos no campo metodológico e, principalmente, no enquadramento da sua prática em organizações, a quem reportam, distintas.

“ Lógica da investigação, lógica do ensino, lógica administrativa e lógica política, podem opor-se, mesmo quando estão de acordo, ao nível, por exemplo, da maneira como assumem, na definição dos seus objectivos, os determinantes do tempo e do espaço da acção.”
(BALSA: 1989; pp. 44)

Segundo o mesmo autor, os investigadores gerem processos que são, maioritariamente, viáveis a longo prazo. 
A lógica administrativa funciona, de igual modo, a médio longo prazo. 
O espaço de sala de aula, para a lógica administrativa, representa uma pequena dimensão. 
As finalidades da acção escolar, através das opções filosóficas e contextualizadas numa lógica política, apontam também para uma gestão de longo prazo. 

  “Fontoura (1992) ao descrever diacronicamente o ensino da língua portuguesa no estrangeiro considera três fases distintas: a primeira, durante a primeira República, em que o estado “entendia dever instrução a todos os cidadãos” (op cit:82), a segunda, a partir de 28 de Maio de 1926 a 1974 e a terceira, a fase pós-25 de Abril de 1974 (Fontoura (1992:82-831). Dos princípios políticos da segunda fase, destaca-se a desresponsabilização do estado em relação à educação, passando esta a pesar sobre a família, sendo o estado um mero cooperador. Nesta fase distinguem-se dois períodos, designadamente de 1926 a 1960 e de 1960 a 1974, diferenciados pelo ensino dentro ou fora do espaço universitário;” de 1926 a 1960 o ensino da língua e da cultura portuguesas é promovido oficialmente no estrangeiro pelo Instituto de Alta Cultura Portuguesas (criado em 1936) apenas ao nível das universidades, através dos leitorados” (Fontoura (op. Cit:82)). De 65 a 74 é estendido a espaços não universitários.” (GROSSO:1999, pp. 61)

O objectivo de todas estas vertentes deve ser a contribuição para a produção da acção educativa. 
Cada actor deve reconhecer as especificidades de cada posição e definir o espaço da sua acção de forma a tratar de zonas distintas mas complementares. 

Considerando-se que a língua é um dos elementos constitutivos da identidade de um povo, a história mostra que a difusão da mesma foi a forma mais comum de domínio entre os povos, dependendo a implantação da língua estrangeira de diferentes conjunturas como a económica e a político-administrativa. No entanto, o seu desenvolvimento está intrinsecamente ligado ao uso diário da língua na comunidade, nas relações familiares, nas tradições, manifestações culturais e na religião. O uso é um factor fundamental para a sobrevivência da língua. 
As relações relacionadas com o uso e a difusão de uma língua podem apresentar-se, para Maria Helena Mira Mateus, numa tripla forma: “1) A língua como forma de construção da pessoa e de comunicação quotidiana do indivíduo, como língua materna. 2) A língua como veículo de escolarização de comunidades que a utilizam como língua segunda. 3) A língua como referência sócio-política e cultural nos espaços em que é língua estrangeira”
 
(MATEUS: 2005; pp.2)


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