sábado, 28 de abril de 2012

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Pequenas histórias 2.





 
Desceu do fretado

Desceu do fretado sem se preocupar com a hora. Atravessou a rua ao aproveitar o semáforo fechado. Ao pisar na outra margem da rua, abotoou a jaqueta por causa do vento frio que fustigava a manhã de um começo de primavera. Mesmo assim, a manhã trazia a beleza intrínseca que era toda dela, com seus movimentos sonoros empurrando a vida de um lado para o outro. Percebia os movimentos como sentia o pulsar dos objetos na mesma intensidade do pulsar do sangue em suas veias. Tinha nos movimentos a lassidão do mundo envolvendo-o num preparo prolongado de fazer o que era preciso, como ferida pustulenta em que se precisa todo o dia pensá-la com produtos químicos a fim de sanar as dores. Corria o risco, estava sempre correndo o risco, de não ter o que o destino lhe prometia. Se soubesse o que lhe era prometido talvez, as dores já teriam sido sanadas. Como não sabia e, achava que não deveria saber, pois se soubesse a vida perderia os encantos, vivia no risco premente de não se sentir o único na parte que lhe cabia ser. Vivia cada minuto intensamente, e gostava de viver os instantes promulgados em atos e ações às vezes impensados, gostava sim, por que não? Isso lhe dava oportunidade de se corrigir dos erros conseqüentes por amar demasiada a vida. Sim. Podia não parecer, amava mais que tudo a vida. Isso não queria dizer que não pudesse fazer o que bem entendesse. Podia, mas primeiramente tinha obrigação com a vida, nada mais. E dentro dessa obrigação agia ao balanço dos ritmos imposto ao viver nada mais que viver, simplesmente.

pastorelli

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