quarta-feira, 16 de maio de 2012

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O ANJO 2 - JANDIRA ZANCHI



O ANJO


2.

- Esse o portal de ouro e luz no azul infinito, demolida a invalidez, a imagem despregada de seu fundo. Acredito que assim principia a alma do corpo.
     O efebo, esguio como aço, perfil delicado na arrogante autoridade, insinuou uma covinha.
- És belo e talvez insolente, Ângelo.
- ..... então, Ângelo! E como pensa em se chamar?
- Já não sou mais a varrida das águas...
- Terminou o deserto.  Também você está despregada do Corpo Matriz.
- Solidão saída de nuvens e nubentes.
- Te chamarei Ariane. Um novo batismo, um outro enfeite.
- Ariane...
 - E será endurecido o teu perfil, em vidrilhos os azuis que se empurram dos olhos, já vítreos de tanta transparência das vestes verdes de sucessivos mestres.
- Também deitarei uns acordes para o contorcionismo de tua face.
- Que seja.
- Qual de nós dois será o outro?
- Seremos um.
- Não há o descanso...
- Sim, envoltos de tanto líquido, estaremos secos, nus, levitados e emancipados das hostes do desejo.
- Compreendo. Uma loura e ímpia lucidez, cuspida e amparada na boa luz.
- Nutriente e nubente, camadas ao redor de si.
- Te desenharei um barco e te deixarei soprar as velas.
- Pois marinheiro de asas agudas é o que sou. O servo daquela que se despediu do ventre e que por ele se levantou.
- Ariane, de ágeis mandíbulas, voraz de verdade e liberdade, a que aceita a abstração tranqüila da ausência de si.
- Ariane, marítima de verbo.
      Curvaram-se as palmas espalmadas como troféus no carinho córrego corrigido. Estariam entre a beira e o desejo, voraz, do Astro.


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