Às
mães
Concepção
Há
algum tempo,
tu
me excitaste o ventre,me beijaste os seios,
mergulhaste em meus cheiros
com tua sanha de homem faminto.
Roçaste teu rosto e teus lábios
ensandecidos, em meu púbis
Deixei
tatuadas em tua pele
as
frases desconexas dos meus gritos.E eu te recebi sobre mim
para te dar a essência de meu gozo.
E tu deixaste dentro de mim a casual
essência de nosso futuro.
partes de nós fundiram-se.
Gestação
Há
pouco tempo,
chegaste
mais tranqüiloe buscaste como um filho,
o calor de minhas coxas.
Tua mão, agora, sem desejo,
cruzou por meu púbis, só de passagem,
e quedou-se, mansamente, sobre meu ventre.
O parto
Há
minuto,
éramos
eu e ela que discutíamos o instante.Eu a convidava, alternando gritos e sussuros,
Sua resposta me chegava como ondas de um frenesi crescente.
Nos momentos de silêncio,
que, pouco a pouco, me pareciam eternos,
eu quedava exausta entre teus braços.
Enquanto
isso,
tu
oscilavas entre altismo e perplexidade.
Mas, enfim, tu te mostravas com a lucidez de meu amante.
Existia,
sim, uma outra mão, um outro olhar,
a
observar este nosso momento.mas ele soube do sentido de tua presença
e manteve-se a uma distância segura
para dar cabo do meu desespero.
No
momento presente,
-
Ah, momento eterno!!!Sopro o suor que me chega da testa
dispo-me das máscaras venezianas
sou fêmea parideira.
-Venha,
minha filha sentir a luz !
Sinta
já que a verdade é dura,que se luta pela vida,
sinta o nosso amor.
Ela
me pressiona o púbis
como
que a abrir uma portaque há pouco, jamais se abrira.
Olho dentro de mim,
vejo aqueles pequenos olhos
que só entendem da simplicidade da escuridão;
eles estão fechados, voltados para as suas poucas certezas.
Mas
o instinto rompe a tênue membrana
e
derrama, através de mim, o seu mar de segurança.Seu corpo se expande como que por milagre, e ocupa
Espaços que até há pouco eram só meus...
Pela
primeira vez me vejo a empurrá-la para o futuro.
Entendo,
então, o sagrado.Mas esse momento fugaz de consciência
esvai-se com a dor.
Eis-me a sentir a dor do parto,
dor sem volta.
Não seria esse o preço da consciência da dor?
por que esta autocomiseração humana?
falta-me a resignação animal.
Mas esta dor não dá tréguas para reflexões filosóficas.
Concluo que, felizmente, sou um animal com acesso à ciência.
Essa dor chega a ser “ desumana¨.
Vamos, filha, que eu te ajudo.
Parteiro, por favor me ajude!!!
O
corpo daquela mão
se
aproxima e ela manobrao ser contorcido em que me transformei.
Relembra-me os fins
com sua voz
pontuada de serenidade.
Agora
já não falo,
já
não penso,somente a dor
com algo mais... que se dissolve no ar,
que me esvazia a memória
ao mesmo tempo que vejo
ser esvaziado meu corpo.
Talvez
um registro iconográfico possa dizer por mim...
E
ela surge tímida,como uma atriz que olha a vida
por detrás de cortinas semi-abertas.
Teme a estréia.
Mas parte para decifrar a luz...
(Neste
momento, o poeta se despe do manto lírico e se cala. Já não pode mais se
aventurar
com
palavras onde o mistério da vida só se faz claro para uma mulher)
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