O ANJO
5.
- Sou
vencida pela eternidade que aqui, nesse santuário, encontrou um ponto de
exclamação, Ângelo!
Ele beijou-a, e manteve o seu corpo,
rígido, apertado ao seu. Aos poucos a moça deixou que suas lágrimas desavisadas
molhassem o rosto do belo rapaz.
- Pode
amar-me? - suspirou.
- Ainda
não sei, mas estou encantado com a tua intensidade.
- Mas
esses meus olhos vítreos...
- São
movidos de terra e ar, fogo e nuance em teu corpo rijo, exigente. És bela,
ousada e exigente, o que te falta é um respaldo, uma visão de amizade,
continuidade. Posso te oferecer o meu braço.
- Para
aqui vim após tantas ruínas e equívocos... só agora percebo teu calor, teu
infinito. Por mais que brindemos e executemos o mundo em nossa arte e ciência,
por mais que, na individuação, galguemos os degraus da complexidade, é só no
amor...
- E que o
amor seja uma amizade, mulher de lei e método, pois o espírito que se eleva é
virgem e sisudo. A satisfação aberta em sua métrica, aprendiz de ouro nas
planícies de muita futilidade. Compraremos uma enxada, abriremos um jardim. Aqui,
são poucas as flores e as aves já que céu e mar, de tão belos, ornam-se a si
mesmos. Ainda assim abaixaremos os olhos e mostraremos a esse altivo astro o
altar de nossos filhos.
-
Construir, não ser mais do que o prumo no ritmo da vida.
- Como se
fazem todas as naves, enfim.
- E
sonhar, e sorrir – ela parecia feliz.
- Tenhamos
projetos. Não precisaremos ser os únicos a labutar nesse lugar. Precisaremos de
outros usos e fusos, pelo menos meia dúzia de alguns outros.
- Tenho
alguns bons amigos.
-
Levantaremos uma comunidade, edifícios, jardins, filhos e netos, vamos
enfileirar alguns livros e riscar outros, compor acordes e aquarelas e
revestirmo-nos em muitas tardes de êxtase e esquecimento.
- Perder-se
no deus, naquele que se deleita. E, meu grande artista, como ser afetivo e
seguir a inventividade e a supremacia?
- Sem
desconexões e ambigüidades . se a vida é faceira, também o sou. É intrigante?
Pois me submeto. Sei louvá-la sem prender-me.
- Procuro
compreender.
- É
ligeiro o instante.
- Como acompanhá-lo?
- Esteja
no macro de tua altivez e, com serenidade, pouse no ângulo, no movimento do
pequeno pássaro, na asa aberta da flor.
- E...
- Por
aqui procuraremos as diversidades, ainda que obscurecidas pelo fulgor do meio.
- O deus
não é uniforme.
- É
pousado na lua e originado no sol, carregado de perfumes. Se desapegue de si,
escute a tênue ou firme, processe-a ao teu ritmo, mansidão da correnteza.
- Mas
você parece-me tão ornado de si mesmo.
- É porque
me envaideço da alegria dos entes.
- E dela
vive.
- Assim,
sem crucificar um amanhã.
- E
chega-se...
-
Vive-se.
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