O ANJO
6.
Durante muitos dias ele levou-a em seu
braço de amigo, fazendo-se acompanhar de algumas palavras, muitos carinhos.
Mostrou-lhe suas telas, exuberantes, fornecidas de grandes anjos, pagãos e
amarelos, brincalhões, comemorados sem luxúrias, um prazer de camaradagem quase
infantil, um belo exorcismo, sem frestas ou dúvidas.
Ela revelou-lhe alguns de seu projetos,
edifícios de grandes dimensões, guardados à bosques e ventos, leitos de rios,
horizontes de reis e sabedoria. Eram clássicos e ligeiros, brancos e mestres em
indulgências.
Achegaram-se a alguns pássaros,
acompanhando os feitios de seus ninhos, a labuta dos insetos e o vaivém das
correntes, admirando-se das vesgas conchas incansavelmente ardendo-se do calor.
Construíram novas moradas, algumas rústicas,
de janelas destampadas, preparadas para o grito das estrelas nas noites de
muito amor, outras imberbes, nuas no mármore, aonde beberiam da lua e das aves,
o trilho das flores saudando-os, ausentes da dor.
Sorriam e sorriam, quase meninos se
fizeram. Para Ariane era um princípio de Verbo, a correção do instinto, a
arquitetura incipiente de um novo trovador, aquele que trocaria a si para
carregar o todo no breve, no instante, ao acaso, aceite de ritmo e razão.
- Mas
sabe-se que finda, pois o tempo tem uma metragem sólida em sua finitude - avisou-o.
- De às
coisas o nome que receberam – corrigiu-a. É a morte.
- Branca
e sossegada.
- Como
deve ser.
- Talvez,
em relação à vida, apenas um pouco esquálida, acompanhando a fosforescente alma
das coisas.
- Ariane
começa a perceber.
-
Ilumino-me no teu amor.
-
Intere-se de si, percorra-se. Aonde você se limita está a tua solução.
- As
estórias e a história.
- Podemos faze-las, interpreta-las.
- Apenas
os instantes são verdadeiros.
- Todos
particularizados, enobrecidos.
- Você
quer dizer-me que a vontade e o fatídico se desmerecem.
- Pois
são construções do corpo e da mente. Pulsões, equívocos de defesa.
- Bem,
então as crianças são o fato.
- Exato,
apenas isso. Quando desenvolver o teu abstrato e arejar e solidificar o teu
consciente, mantenha-se, ainda, no rastro dos pequenos insetos, medite das
formas de levantar as informações das borboletas e oriente-se do intrincado das
rosas do jardim.
- Simples
assim...
- Não
para quem, como você mesma lembrou, conhece os recursos do tempo e sua linha
apontada por sobre a metamorfose das belas formas.
- Muitas
e muitas luas para digerir o líquido, ainda que ciente da forma.
- É
preciso criar as maneiras de movimento sem exageros nos goles de terra e
circunstâncias.
- Você
acha que os elementos têm seus pactos?
- Se
benzem de nossos acertos e levitam também. Conhecem o prazer e cada qual tem o
seu pedaço de deus.
- Alguns
contêm todas as suas faces – e apontou o grande astro.
- Esse, em
seu hélio, cospe informações e seguranças. É o caldeirão benfazejo de nossas
esperanças.
-
Sonharei com você. Em teu braço sinto-me aérea e faminta do perfume das ondas.
Deixemos que o tempo levante as suas marés!
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