quarta-feira, 13 de junho de 2012

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O ANJO 6 - JANDIRA ZANCHI



O ANJO

6.

       Durante muitos dias ele levou-a em seu braço de amigo, fazendo-se acompanhar de algumas palavras, muitos carinhos. Mostrou-lhe suas telas, exuberantes, fornecidas de grandes anjos, pagãos e amarelos, brincalhões, comemorados sem luxúrias, um prazer de camaradagem quase infantil, um belo exorcismo, sem frestas ou dúvidas.
     Ela revelou-lhe alguns de seu projetos, edifícios de grandes dimensões, guardados à bosques e ventos, leitos de rios, horizontes de reis e sabedoria. Eram clássicos e ligeiros, brancos e mestres em indulgências.
     Achegaram-se a alguns pássaros, acompanhando os feitios de seus ninhos, a labuta dos insetos e o vaivém das correntes, admirando-se das vesgas conchas incansavelmente ardendo-se do calor.
    Construíram novas moradas, algumas rústicas, de janelas destampadas, preparadas para o grito das estrelas nas noites de muito amor, outras imberbes, nuas no mármore, aonde beberiam da lua e das aves, o trilho das flores saudando-os, ausentes da dor.
    Sorriam e sorriam, quase meninos se fizeram. Para Ariane era um princípio de Verbo, a correção do instinto, a arquitetura incipiente de um novo trovador, aquele que trocaria a si para carregar o todo no breve, no instante, ao acaso, aceite de ritmo e razão.
- Mas sabe-se que finda, pois o tempo tem uma metragem sólida em sua finitude - avisou-o.
- De às coisas o nome que receberam – corrigiu-a. É a morte.
- Branca e sossegada.
- Como deve ser.
- Talvez, em relação à vida, apenas um pouco esquálida, acompanhando a fosforescente alma das coisas.
- Ariane começa a perceber.
- Ilumino-me no teu amor.
- Intere-se de si, percorra-se. Aonde você se limita está a tua solução.
- As estórias e a história.
- Podemos faze-las, interpreta-las.
- Apenas os instantes são verdadeiros.
- Todos particularizados, enobrecidos.
- Você quer dizer-me que a vontade e o fatídico se desmerecem.
- Pois são construções do corpo e da mente. Pulsões, equívocos de defesa.
- Bem, então as crianças são o fato.
- Exato, apenas isso. Quando desenvolver o teu abstrato e arejar e solidificar o teu consciente, mantenha-se, ainda, no rastro dos pequenos insetos, medite das formas de levantar as informações das borboletas e oriente-se do intrincado das rosas do jardim.
- Simples assim...
- Não para quem, como você mesma lembrou, conhece os recursos do tempo e sua linha apontada por sobre a metamorfose das belas formas.
- Muitas e muitas luas para digerir o líquido, ainda que ciente da forma.
- É preciso criar as maneiras de movimento sem exageros nos goles de terra e circunstâncias.
- Você acha que os elementos têm seus pactos?
- Se benzem de nossos acertos e levitam também. Conhecem o prazer e cada qual tem o seu pedaço de deus.
- Alguns contêm todas as suas faces – e apontou o grande astro.
- Esse, em seu hélio, cospe informações e seguranças. É o caldeirão benfazejo de nossas esperanças.
- Sonharei com você. Em teu braço sinto-me aérea e faminta do perfume das ondas. Deixemos que o tempo levante as suas marés!


      

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