Naqueles
dias, o fake do Todo-Poderoso botou
as manguinhas de fora e resolveu criar seu universo genérico, plano que
acalentava há tempos. Pode-se argumentar que o termo "Universo",
significando "todo, inteiro", não poderia comportar uma outra versão,
qualquer que fosse ela, sob pena do vocábulo cair em descrédito. Mas não é a
essa questão etimológica que vamos nos ater, pelo menos neste despretensioso
relato.
Após
um longo espreguiçamento, o godzinho de araque estalou os dedos, escovou os
dentes, juntou todo o seu ímpeto empreendedor e partiu cheio de vontade para a
intrincada missão. Começou concebendo o firmamento, que depois de ficar pronto
demonstrou não ser firme o suficiente. Sim, amigos. O firmamento apresentava
sérios e incontornáveis problemas de encaixe, não se fixava corretamente sobre
o espaço infinito e jamais passaria pelo menos rigoroso dos controles de
qualidade. Eram ainda visíveis rachaduras de natureza estrutural, evidenciando
erros básicos de cálculo.
Nosso
criador do mercado paralelo não se deixou abalar por esse primeiro contratempo
e pôs-se a fazer as estrelas, tarefa que o manteve entretido por umas dezesseis
longas horas, que teriam sido bem gastas se a empreitada chegasse a bom termo.
Mas qual não foi sua surpresa ao constatar que todas elas nasceram cadentes (ou
decadentes, como queiram), já que não paravam no já citado bambo firmamento.
É
claro que o planeta Terra recebeu especial atenção do fake, que demonstrava o mesmo e incansável empenho em tudo o que
executasse, desde o protótipo do abridor de latas até o ciclo das marés. Passou
noites e mais noites em claro tentando dar forma ao cavalo de três orelhas e à
rosa de pétalas não-despetaláveis (qualidade que, segundo ele, aumentaria em
muito a vida útil das mesmas). Todavia, quanto mais tentava implementar aperfeiçoamentos
às coisas do universo mais quebrava a cara em seu intento, revelando-se um
verdadeiro trapalhão ao trocar as cores das verduras e legumes do tradicional
verde para o vermelho, o azul e o rosa-choque, buscando com essa mudança
despertar o interesse e a gula das crianças.
As
anomalias de fabricação foram se perpetrando em série, como numa linha
defeituosa de montagem. Feita também nas coxas, a água materializou-se na forma
de H3O, trazendo com isso inconvenientes vários - dentre eles o mais básico e
catastrófico, ou seja, o de não matar a sede em hipótese alguma.
Ao
contrário do Todo-Poderoso de verdade, o deus postiço prometia a vida eterna
mas não tinha a menor ideia de como entregar a mercadoria. O paraíso para os
bons ficava só na promessa, uma espécie de título do governo com resgate em
data imprecisa. Um precatório celeste, para ser mais exato – o que gerou uma
série de processos junto aos órgãos de defesa do consumidor da época, movidos
por centenas de milhares de crédulos lesados.
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Marcelo Pirajá Sguassábia é
redator publicitário e colunista em diversas publicações impressas e
eletrônicas.
Blog:
Email: msguassabia@yahoo.com.br
2 comentários
Marcelo: Texto enxuto, hilário, bem escrito.Aguardo mais.Forte abraço.
Meu caro André,
Agradeço a leitura, o comentário e o incentivo. Um grande abraço!
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