quarta-feira, 13 de março de 2013

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A mesa do restaurante



Já que cansei os de casa com esse assunto, essa enfadonha (para os familiares!) compulsão de comentar a dispersão virtual das pessoas nos restaurantes, locais públicos e, certamente, em suas próprias residências, me calo e passo a bola para a mesa, dessa agradável cantina italiana, que frequento regularmente:
‒ Sou muito discreta, passo geralmente despercebida aos que me utilizam como apoio, e, por estar sempre no mesmo lugar (salvo as mudanças de alguns metros durante a limpeza da cantina ou quando me junto a minhas companheiras para acolher grupos maiores), posso dizer, sem possibilidade de erro, do retrocesso que ocorreu na interlocução humana nos últimos  quinze anos.
Como o espaço é curto, e o tempo de vocês está cada vez mais escasso, vou dar apenas um exemplo: ontem mesmo,  sentou-se às minhas companheiras de serviço, um casal com três filhos. Fiquei na expectativa – no maior silêncio – para desfrutar daquele convívio familiar (insisto em ser otimista – já me disseram as cadeiras).
Após os primeiros comentários, enquanto decidiam por uma entrada, bebidas e prato principal, repetiu-se a cena de sempre, infelizmente para vocês, como se fosse uma verdadeira epidemia. E é uma epidemia, para qual dou o diagnóstico de “Síndrome da pseudopresença”. Eles sacaram de seus aparatos tecnológicos, verdadeiras armas de aniquilamento em massa da troca efetiva de afeto. O pai, no celular, discutia algum assunto chato de trabalho (meu amigo ... são oito da noite...) sempre inadiável ... Como não ouvia bem, levantou-se e foi para fora do restaurante e só retornou quando o garçon o avisou de que o jantar estava servido. A esposa...  Ligou para uma amiga e começou uma conversa animada sobre a academia do dia seguinte e algo (não entendi direito) sobre um casal da mesa ao lado.
A filha mais velha apoiou-se em mim e com o Ipod em mãos, submergiu no Facebook. O filho do meio arriou-se sobre minha companheira e ficou jogando no seu Ipod. O filho pequeno ... Coitadinho do filho pequeno ... Sobrou um filminho que a mãe colocou no Tablet para passar o tempo ...  
De repente, uma surpresa, a filha reclamou para a mãe: “Mãe ... Meu irmão tá me cutucando...  Manda ele parar!”
Olha ... se tem uma coisa de que gosto (sou uma mesa voyeur ) é ficar espiando tudo que se passa por baixo de meu vestido... Mas não tinha acontecido nada, as pernas das crianças estavam distantes, mal encostavam em minhas pernas...
A explicação, para essa mesa desatualizada que vos fala, veio como um balde de gelo entornado sobre minha cabeça: o menino entrou no Facebooke ficou atrapalhando o diálogo de sua irmã com as amigas. É, nada mudou ... Ou melhor ... Tudo mudou.
Foi-se o tempo em que as crianças faziam cócegas em minhas costas desenhando ou jogando o jogo da velha; que, de tão animadas, chutavam minhas canelas e os casais se acariciavam com os pés me fazendo sentir uns  arrepios...
Bom, acho que não preciso dizer mais nada. A uma mesa de restaurante, todos os dias, cabe aguardar o final da refeição, quando os virtuais presentes retornam do mundo sentados em suas cadeiras voadoras ...
Espero ter sido útil aos mais sensíveis.
Para mim, só resta uma esperança: ser vendida para algum boteco, ouvi dizer que, pelo menos por lá, ainda se mantêm papos animados, do tipo olho no olho. 

Jorge Elias Neto

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