São Paulo - Casanova feminina
Nas minhas andanças, fui à São
Paulo para entregar uns trabalhos prontos para a redação do jornal. Quando ia
até a capital, me hospedava em casa de uma amiga chamada Alice. À noite, após os trabalhos em dia, sentávamos
ela e eu, para um bate papo e um bom vinho. Algumas taças de vinho depois, ela
me contava histórias sobre sua vida. Uma delas me fez rir muito. Foi mais
ou menos assim a narrativa dela.
Em um dia sem sol, com ares de
que logo viria uma chuva fenomenal, Alice saiu para a caçada da semana. Ela
nunca deixava passar a oportunidade de conhecer, chegar e dar a final em um
belo espécime masculino. Principalmente se estivesse desacompanhado e com jeito
de querer querendo.
Seu carro esporte saiu muito de
mansinho da garagem de seu prédio, e dirigiu-se para a movimentada Avenida
Paulista, onde tudo acontecia. Achou uma vaguinha para o pequeno Audi
conversível prata, que, onde quer que estivesse, chamava a atenção. Não foi à toa
que ela escolheu aquele modelo. Ajudava na caça, dizia ela.
Quando desceu do carro a chuva já
ia desarrumando as folhas das árvores na Avenida. O vento forte fazia
redemoinhos pelas calçadas.
Alice usava um curto vestido
esvoaçante cor de pérola, sandália altíssima vermelha e bolsa da mesma cor. Sua
beleza, mesmo que não quisesse, dizia que ela havia chegado a qualquer dos lugares
onde fosse.
Morena de encher os olhos, e
ainda valorizava mais essa beleza com as melhores grifes.
O vento da rua levantava a saia,
que era mais curta que o necessário, e os cabelos molhados pela chuva que
começara a cair, escorriam pelos ombros. Ao tentar pular uma poça de água no
meio fio da rua, sua sandália escapuliu do pé, e se não fosse dois oportunos
braços ampararem-na, ela teria estatelado na calçada.
O homem que a protegeu do tombo
certo, ria ao tomá-la nos braços, carregando-a para dentro de um barzinho, já
lotado pelos mais diversos e heterogêneos exemplares de seres humanos. Enquanto
era carregada, Alice analisava seu salvador, porque se não a agradasse, ela não
teria nenhum escrúpulo em despachá-lo na mesma hora. Mas, a análise prévia agradou.
Soltando-a levemente ao lado de uma mesa, ele apresentou-se. O nome, o sorriso,
a fala doce, o olhar zero grau, tranquilizou a moça. Ela aceitou o convite para
um Martini duplo, pois estava precisando. Não tanto pela roupa molhada nem o
cabelo espatifado, mas pelo desconcertante tom de autoconfiança do galante
cavalheiro que a recolheu da chuva.
Tem certas horas que uma caçadora
deve tomar cuidado. Muito cuidado. Essa era uma delas. Afinal, a caçada deve
ser desigual para que dê certo e tenha graça. E esse espécime bonito e
agradável, poderia complicar o desenrolar dos acontecimentos para ela. Mas, o
desafio vale a pena em qualquer ocasião.
Após muitos martinis, sorrisos,
sussurros e dengos, ambos resolveram sair do já enfumaçado barzinho para
encontrarem um local mais aconchegante. Afinal, a chuva se fora.
Na calçada, ficaram no 'vamos no
meu carro' e 'não, vamos no meu' por alguns minutos, até que decidiram cada um
ir no seu para a casa do oportuno salvador de moças que caem na chuva. Não era
longe. Chegaram rapidinho.
Que festa foi a sessão de amasso,
regada a um bom vinho tinto.
No rola e rola Alice se deixou
levar pela emoção, e pela primeira vez na vida disse a um parceiro de caçada
que queria repetir a dose em outra ocasião.
Que desastre. O cara era também
caçador. E igual a ela, não repetia a dose com ninguém. Nunca.
Pela primeira vez na vida Alice
quis repetir, e encontrou um casanova que não quis. Ela não merecia isso. E
pelo sim ou pelo não, falou que estava brincando. Que ela também nunca repetia
o mesmo parceiro em nenhuma ocasião.
Paciência. Ela voltou para sua
casa pensando que foi melhor assim.
Afinal, uma caçadora que se preze
não repete o mesmo homem por nada neste mundo. Não mesmo.
Seja o primeiro a comentar:
Postar um comentário