domingo, 30 de junho de 2013

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Viagens - Capítulo IX

São Paulo - Casanova feminina

Nas minhas andanças, fui à São Paulo para entregar uns trabalhos prontos para a redação do jornal. Quando ia até a capital, me hospedava em casa de uma amiga chamada Alice.  À noite, após os trabalhos em dia, sentávamos ela e eu, para um bate papo e um bom vinho. Algumas taças de vinho depois, ela me contava histórias sobre sua vida. Uma delas me fez rir muito. Foi mais ou menos assim a narrativa dela.
Em um dia sem sol, com ares de que logo viria uma chuva fenomenal, Alice saiu para a caçada da semana. Ela nunca deixava passar a oportunidade de conhecer, chegar e dar a final em um belo espécime masculino. Principalmente se estivesse desacompanhado e com jeito de querer querendo.
Seu carro esporte saiu muito de mansinho da garagem de seu prédio, e dirigiu-se para a movimentada Avenida Paulista, onde tudo acontecia. Achou uma vaguinha para o pequeno Audi conversível prata, que, onde quer que estivesse, chamava a atenção. Não foi à toa que ela escolheu aquele modelo. Ajudava na caça, dizia ela.
Quando desceu do carro a chuva já ia desarrumando as folhas das árvores na Avenida. O vento forte fazia redemoinhos pelas calçadas.
Alice usava um curto vestido esvoaçante cor de pérola, sandália altíssima vermelha e bolsa da mesma cor. Sua beleza, mesmo que não quisesse, dizia que ela havia chegado a qualquer dos lugares onde fosse.
Morena de encher os olhos, e ainda valorizava mais essa beleza com as melhores grifes.
O vento da rua levantava a saia, que era mais curta que o necessário, e os cabelos molhados pela chuva que começara a cair, escorriam pelos ombros. Ao tentar pular uma poça de água no meio fio da rua, sua sandália escapuliu do pé, e se não fosse dois oportunos braços ampararem-na, ela teria estatelado na calçada.
O homem que a protegeu do tombo certo, ria ao tomá-la nos braços, carregando-a para dentro de um barzinho, já lotado pelos mais diversos e heterogêneos exemplares de seres humanos. Enquanto era carregada, Alice analisava seu salvador, porque se não a agradasse, ela não teria nenhum escrúpulo em despachá-lo na mesma hora. Mas, a análise prévia agradou. Soltando-a levemente ao lado de uma mesa, ele apresentou-se. O nome, o sorriso, a fala doce, o olhar zero grau, tranquilizou a moça. Ela aceitou o convite para um Martini duplo, pois estava precisando. Não tanto pela roupa molhada nem o cabelo espatifado, mas pelo desconcertante tom de autoconfiança do galante cavalheiro que a recolheu da chuva.
Tem certas horas que uma caçadora deve tomar cuidado. Muito cuidado. Essa era uma delas. Afinal, a caçada deve ser desigual para que dê certo e tenha graça. E esse espécime bonito e agradável, poderia complicar o desenrolar dos acontecimentos para ela. Mas, o desafio vale a pena em qualquer ocasião.
Após muitos martinis, sorrisos, sussurros e dengos, ambos resolveram sair do já enfumaçado barzinho para encontrarem um local mais aconchegante. Afinal, a chuva se fora.
Na calçada, ficaram no 'vamos no meu carro' e 'não, vamos no meu' por alguns minutos, até que decidiram cada um ir no seu para a casa do oportuno salvador de moças que caem na chuva. Não era longe. Chegaram rapidinho.
Que festa foi a sessão de amasso, regada a um bom vinho tinto.
No rola e rola Alice se deixou levar pela emoção, e pela primeira vez na vida disse a um parceiro de caçada que queria repetir a dose em outra ocasião.
Que desastre. O cara era também caçador. E igual a ela, não repetia a dose com ninguém. Nunca.
Pela primeira vez na vida Alice quis repetir, e encontrou um casanova que não quis. Ela não merecia isso. E pelo sim ou pelo não, falou que estava brincando. Que ela também nunca repetia o mesmo parceiro em nenhuma ocasião.
Paciência. Ela voltou para sua casa pensando que foi melhor assim.

Afinal, uma caçadora que se preze não repete o mesmo homem por nada neste mundo. Não mesmo.

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