Ela escuta o ruído dos meus
passos subindo as escadas e levanta as orelhas atentas. Arregala os olhos e
todos os seus sentidos se dirigem à porta de entrada, onde ela me recebe com um
miado manhoso, como a dizer: “Isso são horas de chegar? Esqueceu que eu fico
aqui te esperando?”. Mas Flor de Lótus é dócil, tem um olhar agradecido quando
me vê e fica à espera de um agrado, ou de uma saudação meio melosa, que ela
intui ser algo parecido como “estava com saudade de você”.
Só os que amam gatos são
capazes de entender essa ligação inexplicável desses bichanos com os humanos e
vice-versa, de cumplicidade e carinho. Mas se você, leitor, não gosta de gatos,
possivelmente nem está mais lendo esse texto... Ou talvez siga lendo, levado pela
curiosidade...
Muitos afirmam que os gatos
são sensitivos, altamente inteligentes e intuitivos. Que são espiritualizados. Que
não gostam de pessoas negativas e de má índole. A verdade é que esses felinos
domésticos sempre dividiram opiniões, desde os primórdios da Civilização. Com
eles, não existe meio-termo!
Ao mesmo tempo em que eram
venerados como “deuses” na Antiguidade, nas culturas egípcia, birmanesa, celta,
latina, nórdica e celta, os gatos também foram odiados e vítimas de crueldades
durante a Idade Média, quando eram queimados vivos junto com as bruxas... Triste
é constatar que até hoje existam pessoas capazes de torturar e matar gatos, por
não suportarem seus miados noturnos, ou pela simples razão de serem gatos...
E foi possivelmente no tempo
da Inquisição que surgiram referências nada abonadoras a respeito desses
misteriosos felinos de olhares penetrantes, tais como “gato preto dá azar”, “é
traiçoeiro”, “tem sete vidas”, ou “arranha e esconde as unhas”...
Características, aliás, muito mais fáceis de serem encontradas entre os próprios
seres “humanos” do que entre os animais, que caçam para sobreviver, apenas...
Flor de Lótus agora mia
insistentemente, como se tivesse choramingando, e me conduz ao pote de ração. Fica
me olhando com aquele irresistível olhar “pidão”. - Ok, você venceu, Flor!
Cubro o prato com a ração e
troco a água do pote. – Ufa! Faço carinho em sua pelagem tricolor e ela agora
me lança um olhar agradecido. Vai direto para o tapete da sala e se esparrama,
bem no meio, tomando posse.
Vou ao banheiro e ela vem
correndo atrás de mim, pula na pia e volta a miar, dessa vez olhando para a
torneira. Ela gosta de água corrente...
Depois preparo a mesa para o
lanche e ela sobe no móvel, se ajeita em um canto e fica me encarando, no fundo
dos olhos, para captar como estou. E sempre acerta...
Agora está na hora de
conferir as novidades da rede social. Lá vem ela de novo! Flor de Lótus pula na
mesa e em seguida no meu colo, recebe o carinho esperado e fica ronronando. –
Como ela adivinhou que estava precisando de atenção, depois de um dia
exaustivo? Mistérios felinos...
Sônia Pillon é jornalista e escritora, nascida em Porto Alegre (RS) e desde 1996 radicada em Jaraguá do Sul (SC).
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