segunda-feira, 9 de setembro de 2013

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Pequenas histórias 68





Ele deu um longo e esticado espreguiçamento. Sentiu os músculos repuxados.
Ergueu bem os braços forçando o tronco a se alongar. Depois, girou a cabeça de um lado para o outro. Olhou o pessoal compenetrado no serviço. Cada um com suas preocupações. Cada um com seus esquemas de vida. Com seus sentimentos nobres e angústias plebeias a espera do milagroso sábado.
Finalmente o sol se infiltrava pelas cortinas fechadas. O dia se fazia em seu esplendor dentro da prisão a qual, era obrigado permanecer. O bocejar quase contínuo inundou seus olhos de lágrimas que escorreu desimpedida de obstáculos.
Pensou no que escrever. Não tinha um fio condutor como ontem e anteontem. O que o ajudou foram à fluidez dos sonhos que ficaram martelando na mente. Hoje não sonhou, isto é, se sonhou não sabe, pois como dizem os médicos: o ser humano sonha a noite inteira.
Correu os dedos pelo teclado preto. Percebeu a força das palavras. Cutucavam a pele num processo doloroso desenfreando movimentos rápidos para os lados e para cima e para baixo. O vazio desencadeava outros vazios que se chocavam um com outro tolhendo a criatividade. A inspiração tornava-se ofegante onde as palavras balbuciadas eram constantemente escritas e reescritas.
Abriu a garrafa tomou um bom gole de café. O gosto adocicado caiu no estomago refazendo com que o sistema tomasse as providencias devidas. Ficou a escuta por momentos, com os olhos pregados no horizonte da parede a sua frente. No branco sujo havia uma mancha mais saliente do que as demais. Não conseguia tirar os olhos dela. Parecia que formava um rosto, depois se alongava numa flor com proporções surrealistas, terminando por voltar a ser um rosto. Assim ficou por minutos que lhe valeram horas. Ao perceber a divagação o sol se escondia por traz das persianas. Olhou o relógio. Fechou os programas salvando os arquivos. Guardou os papéis. Deu uma ordem na mesa. Desligou o computador. Saiu para a liberdade de poucas horas. Liberdade de engano, de falsificação. Não podia fazer o que bem entendesse. Vamos dizer. Cumpriu com uma obrigação, agora teria que cumprir outra chegando a casa para que a engrenagem matrimonial funcionasse dentro da podre burguesia. Como sempre, ao chegar não encontrou ninguém. Fechou a porta, passou a chave e desapareceu envolto nos pensamentos.
Lá fora o sol lambeu a porta da imensidão onde a fantasia se realizava a cada findar de um novo dia.

pastorelli

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