Não tarda e chega de novo a hora dela: a compra de mês.
Lá vão os dois. No caminho, o marido vai pensando na série interminável de procedimentos à espera: da prateleira para o carrinho, do carrinho para o caixa, do caixa para o carrinho de novo, daí para o porta-malas, do porta-malas para o carrinho do prédio, do carrinho do prédio para a despensa de casa. Haja saco e saquinho de supermercado. Aliás, esses sim, resistem a tudo. Se você colocar mais que uma pasta de dente em cada um, a alça arrebenta.
É assim há 20 anos, todo santo dia 15, a melhor data para a fatura do cartão. Multiplicando-se os 20 anos por 12, temos a fantástica cifra de 240 compras de mês no decorrer do período.
Chegaram. É claro que o carrinho deles tem a roda enguiçada, que fica puxando pra um lado. Enquanto está vazio, tudo bem, quase não dá pra notar o incômodo. Mas à medida que o carrinho vai enchendo, o manobrista vai se enchendo junto.
Um carrinho vazio de supermercado nunca está vazio de tudo. Há sempre um raminho de brócolis esmagado, uma etiqueta de sutiã 54 e outras coisinhas do gênero, que podemos chamar de restos mortais da batalha anterior. Às vezes tem também a lista de compras da pessoa que usou o carrinho antes de você. Aquela listinha bem caseira, dobrada em quatro. Os ítens encontrados estão ticados ou riscados. Pode ser o contrário – o que está na lista é o que ainda tem em casa, pra lembrar de não comprar. Uma dica: se você estiver sem sua listinha pessoal, leia a do usuário anterior. Talvez você se lembre de alguma coisa que tinha esquecido.
Exemplo de lista típica, de autor anônimo:
Guardanapo – trazer 4 do + barato.
Pó de café – ñ comprar.
Bolacha de recheio – tem 2
Pipoca de microondas – pegar aquela do palhacinho, ñ lembro a marca.
E por aí vai. São todas mais ou menos assim.
O locutor anuncia uma oferta relâmpago. Ela lembra quando, em 1992, quase testemunhou o soterramento de uma velhinha num quiosque promocional de leite condensado. No empurra-empurra, entornaram a anciã no mar de latinhas, com as pernas pra cima e as anáguas à mostra.
Olha pra um lado, olha pro outro, ninguém está vendo. E ele devolve o Detefon Mata-Tudo na gôndola do grão-de-bico. Quem não faz isso? Mês passado ele encontrou um par de Havaianas tamanho 41 em cima de um filé de merluza, em oferta a 9,90 o quilo.
Por mais unido que seja, há o momento da separação do casal no supermercado, na seção de cosméticos. Ali a mulher vai passar pelo menos 45 minutos. Sabendo o tempo que vai perder, ele vai para aquele corredor perto das rações de cachorro, onde tem broca, estopa, cera automotiva e chave de fenda. É o habitat do macho de bermuda, camiseta regata, chinelão e barba por fazer.
Fim das compras, resta pegar a fila do caixa. Todas estão mais ou menos do mesmo tamanho, é preciso escolher uma. Meia hora depois eles percebem que é justamente essa uma que não anda. Todas as filas vão de vento em popa, menos a deles. É quando eles reparam no crachá da funcionária: “Em Treinamento”. Azar, agora é tarde pra entrar em outra fila.
Enquanto um vai colocando as coisas na esteira, o outro vai embalando. Mas aí a patroa lembra: “Nossa, esqueci o rodo!”
Que legal. Nada mais prático pra embalar e pra enfiar depois dentro do carro. Lá vai o maridão correndo feito um fugitivo da polícia, atrás do rodo esquecido. Chega lá e se depara com 16 tipos de rodos diferentes: com cabo de madeira, sem cabo de madeira, de alumínio, com borracha grande, com borracha pequena, com duplo borrachão, com triplo borrachão e exclusiva fita deslizante. Pega o que parece mais apresentável e nem olha o preço – a fila está parada, esperando por ele.
Mais surpresas. A água sanitária vazou bem em cima da baguete. O coalho do queijo fresco encharcou o sabão em pó. A cartela de danoninho, que estava lá no fundo, foi impiedosamente massacrada por uma PET Xereta de 2 litros. Acionado o fiscal do estabelecimento, o marido explica a história, diz que não foi culpa dele. Em vão. Vai ter que pagar pelo que fez e que não vai comer.
Lá vão os dois. No caminho, o marido vai pensando na série interminável de procedimentos à espera: da prateleira para o carrinho, do carrinho para o caixa, do caixa para o carrinho de novo, daí para o porta-malas, do porta-malas para o carrinho do prédio, do carrinho do prédio para a despensa de casa. Haja saco e saquinho de supermercado. Aliás, esses sim, resistem a tudo. Se você colocar mais que uma pasta de dente em cada um, a alça arrebenta.
É assim há 20 anos, todo santo dia 15, a melhor data para a fatura do cartão. Multiplicando-se os 20 anos por 12, temos a fantástica cifra de 240 compras de mês no decorrer do período.
Chegaram. É claro que o carrinho deles tem a roda enguiçada, que fica puxando pra um lado. Enquanto está vazio, tudo bem, quase não dá pra notar o incômodo. Mas à medida que o carrinho vai enchendo, o manobrista vai se enchendo junto.
Um carrinho vazio de supermercado nunca está vazio de tudo. Há sempre um raminho de brócolis esmagado, uma etiqueta de sutiã 54 e outras coisinhas do gênero, que podemos chamar de restos mortais da batalha anterior. Às vezes tem também a lista de compras da pessoa que usou o carrinho antes de você. Aquela listinha bem caseira, dobrada em quatro. Os ítens encontrados estão ticados ou riscados. Pode ser o contrário – o que está na lista é o que ainda tem em casa, pra lembrar de não comprar. Uma dica: se você estiver sem sua listinha pessoal, leia a do usuário anterior. Talvez você se lembre de alguma coisa que tinha esquecido.
Exemplo de lista típica, de autor anônimo:
Guardanapo – trazer 4 do + barato.
Pó de café – ñ comprar.
Bolacha de recheio – tem 2
Pipoca de microondas – pegar aquela do palhacinho, ñ lembro a marca.
E por aí vai. São todas mais ou menos assim.
O locutor anuncia uma oferta relâmpago. Ela lembra quando, em 1992, quase testemunhou o soterramento de uma velhinha num quiosque promocional de leite condensado. No empurra-empurra, entornaram a anciã no mar de latinhas, com as pernas pra cima e as anáguas à mostra.
Olha pra um lado, olha pro outro, ninguém está vendo. E ele devolve o Detefon Mata-Tudo na gôndola do grão-de-bico. Quem não faz isso? Mês passado ele encontrou um par de Havaianas tamanho 41 em cima de um filé de merluza, em oferta a 9,90 o quilo.
Por mais unido que seja, há o momento da separação do casal no supermercado, na seção de cosméticos. Ali a mulher vai passar pelo menos 45 minutos. Sabendo o tempo que vai perder, ele vai para aquele corredor perto das rações de cachorro, onde tem broca, estopa, cera automotiva e chave de fenda. É o habitat do macho de bermuda, camiseta regata, chinelão e barba por fazer.
Fim das compras, resta pegar a fila do caixa. Todas estão mais ou menos do mesmo tamanho, é preciso escolher uma. Meia hora depois eles percebem que é justamente essa uma que não anda. Todas as filas vão de vento em popa, menos a deles. É quando eles reparam no crachá da funcionária: “Em Treinamento”. Azar, agora é tarde pra entrar em outra fila.
Enquanto um vai colocando as coisas na esteira, o outro vai embalando. Mas aí a patroa lembra: “Nossa, esqueci o rodo!”
Que legal. Nada mais prático pra embalar e pra enfiar depois dentro do carro. Lá vai o maridão correndo feito um fugitivo da polícia, atrás do rodo esquecido. Chega lá e se depara com 16 tipos de rodos diferentes: com cabo de madeira, sem cabo de madeira, de alumínio, com borracha grande, com borracha pequena, com duplo borrachão, com triplo borrachão e exclusiva fita deslizante. Pega o que parece mais apresentável e nem olha o preço – a fila está parada, esperando por ele.
Mais surpresas. A água sanitária vazou bem em cima da baguete. O coalho do queijo fresco encharcou o sabão em pó. A cartela de danoninho, que estava lá no fundo, foi impiedosamente massacrada por uma PET Xereta de 2 litros. Acionado o fiscal do estabelecimento, o marido explica a história, diz que não foi culpa dele. Em vão. Vai ter que pagar pelo que fez e que não vai comer.
Na saída, cadê o carro? A3, C5, B4? Ficam zanzando a esmo pelo labirinto de automóveis. Encontrado o Corcelzinho, guardam as compras e chegam à cancela.
- Benhê, o cartão do estacionamento.
- Ué, pensei que estava com você...
Inspeção no porta-luvas, embaixo dos bancos, nos bolsos, na bolsa...
Pensa que acabou? Imagina. É como diz o saquinho – “Volte Sempre”. Dia 15 do mês que vem tem mais.
© Direitos Reservados
Marcelo Pirajá Sguassábia é
redator publicitário e colunista em diversas publicações impressas e
eletrônicas.
Blog:
Email: msguassabia@yahoo.com.br
Seja o primeiro a comentar:
Postar um comentário