quarta-feira, 2 de abril de 2014

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a case que se enche, Rui Tinoco

a case que se enche
de memórias de outras
gerações. o relógio de pêndulo
marcou a rotina do meu
avô. gestos que agora só posso
imaginar, mas que estão ali
quando dá as horas, ao
jantar, entre as palavras
dos meus velhos pais. lá
em cima, no meu antigo
quarto, filhos e sobrinhos
soltam gargalhadas
numa algazarra que já
foi a minha. a existência
é assim: desloca-se continuamente.
enfim, são horas. fazem-se
as despedidas, a mãe aconselha
que guie com cuidado.
nas suas pupilas vejo refletida
a criança que nunca mais
poderei ser. é então que a
abraço: «que tens?»
«não foi nada, mãe, não
foi nada».

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