quinta-feira, 9 de outubro de 2014

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Luzes de Luisa Geisler



Um breve comentário e trechos de Luzes de emergência se acenderão automaticamente, de Luisa Geisler, Alfaguara, 2014.

Eu gostei muito do Luzes de emergência; não sei dizer se é melhor ou pior que Quiçá. Acho que são livros com pegadas diferentes, igualmente interessantes; o que é ótimo e difícil de fazer (posto que a maioria dos escritores está sempre re-escrevendo o mesmo livro, aprimorando uma mesma ideia). Apesar de terem lá a sua similaridade na temática existencial e nalguma coisa de luminoso – tipo Green Light ou Luzes de emergência.

Eu achei muito interessante a estrutura do livro. A organização meio errática em cartinhas simples que vão se juntando, sendo colecionadas. Que a gente não sabe bem aonde é que vai dar. E, de repente, (perceba um arco sendo tensionado por uma flecha) zzzzzzzzip, acerta em cheio o coração! Um coração flechado de humanidade.

Minhas passagens prediletas:

Verdade seja dita, Administração é um curso longo demais. Acho que é alguma coisa ligada a comprar mais tempo para saber o que eu quero. Mas fazer o que se quer é uma ideia que me incomoda bastante. Daí eu fico escrevendo.

Aqui é o momento em que eu paro e penso em qual resposta te dar. Penso em dizer “se tu não quer ler, não precisa” ou “porque eu não tinha ninguém com quem falar.” Mas isso tudo ia soar depressivo e exagerado.

Eu cada vez mais me pergunto onde eu deveria estar e se eu ainda consigo pensar coisas novas. Conhece aquela história de que dez mil horas de prática te faz um especialista em qualquer coisa? Tipo essas crianças prodígio idiotas, sei lá. É isso. Se eu fosse bom em alguma coisa, eu já devia ser. Se alguma coisa fosse diferente pra mim, eu já saberia. Eu sei que eu sou igual a todo mundo, penso igual, ajo igual, tenho os mesmos problemas. E se alguém me perguntasse por que eu tenho que viver ao invés de outra pessoa, eu não saberia o que dizer.

Tu não devia deixar coisas idiotas como estágio ou faculdade te deixarem puto só porque eles têm essa coisa de ser relevante pra sociedade e influenciar a economia tipo fazer o mundo girar. Teus talentos refletiam teus interesses, e o que importava para ti era importante.

Acho que minha meta de vida é não acordar um dia aos cinquenta anos num emprego que eu odeio porque me forçaram a estabelecer metas de vida quando eu era novo demais.

Tenho a sensação de que eu vou ficar o resto da minha vida procurando o que é que eu quero fazer e tal e nunca vou saber exatamente. Esse sentimento adolescente meio que permanece. Eu aos dezoito vou achar que aos vinte e dois vou saber, e daí aos vinte e dois vou achar que vou saber aos vinte e cinco, aos vinte e sete, aos trinta, aos trinta e cinco. Quando tu vê, tu não tem mais chances de fazer o que tu quer porque tu passou todo esse tempo procurando o que era isso.

Queria voltar lá. Não mudar as coisas, mas mudar as coisas. Faz sentido isso? Acho que não queria mudar as coisas (talvez avisar pra mim mesmo alguns resultados esperados e evitáveis).

(Não sei se falei (ou só pensei) isso). Amor é andar de mãos dadas, meu velho. Mãos dadas é a coisa mais ridícula que um casal pode fazer. Cachorro e dono. Não é prático, alguém puxa prum lado, tem um ritmo estranho de caminhar. Isso é amor. Amor é pouco prático, desconfortável (mas tu não quer soltar). Porra.

De uma certa forma, um relacionamento são duas pessoas que se recusam a desistir uma da outra. Duas pessoas igualmente ferradas, claro.

Até porque cada livro tem uma última página. Toda novela tem um último capítulo. E aceitar que nenhuma dessas pessoas vai estar perto de ti de novo racha tua cara que nem uma pedra que atravessa o vidro da janela. Um buraco, daí os cacos em torno do buraco, as rachaduras, o eco da ausência. Em algum momento a fita VHS para. Sempre chega naquele troço colorido que faz piii, e depois o chiado que acabou. Som chiado, cores chiadas.





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