sexta-feira, 4 de novembro de 2016

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Pequenas histórias 250

O médico lhe dissera

 

O médico lhe dissera:
- Isso é característica sua, do seu corpo, do seu organismo.
Ah! Quer dizer que esse Alien que tenho na barriga é característica minha? Eu que quis ter esse monstrinho, é? Que coisa!
- É gordura em pelotada, como caroços que as pessoas têm nas costas, tipo sebo. Não lhe faz mal nenhum, se quiser pode operar, em minha opinião não aconselho. Você não vai querer ficar com uma cicatriz feia na barriga.
Ah! Além de tudo está me chamando de seboso, é? Eu terei que passar o resto da vida com essa, como é mesmo que o senhor disse?
- Gordura em pelotada.
Isso mesmo. Vou ter que passar o resto da vida com pelotas de gordura avolumando na barriga. E se aumentar? Se crescerem outras? Ainda bem que não é para fora, é para dentro, só passando a mão é que se percebe.
Quando ele entrou no consultório, a primeira pergunta, depois de cumprimentá-lo e pedir que se sentasse, foi:
- Quem me indicou?
Quem indicou o senhor? Bem, Doutor foi o Doutor da firma.
- Qual o nome desse Doutor?
Porra! Doutor, o senhor faz pergunta difícil. Engraçado tenho ido sempre me consultar e até hoje não guardei o nome dele.
- Que firma o senhor trabalha?
Agipliquigas, ops! Desculpe Doutor, é Liquigas Distribuidora.
- Tudo bem.
Obrigado, Doutor até que o senhor é compreensivo.
- E o que traz aqui?
Bem, Doutor, o caso é que...
E, constrangido descreveu os sintomas intestinais pelos quais estava passando. Disse que sofria de diarreia, que em determinado dias seu intestino funcionava até que legal, mas outros dias era um desarranjo infernal, tendo dias de ter ido ao banheiro umas dez vezes.
-  Não é normal, mesmo.
Então, Doutor. Não tenho feito extravagância, tenho me alimentado normalmente...
- E que mais?
E há essas protuberâncias na barriga. E também, como há um histórico de câncer na família, meus pais, tios, tias e, agora, minha irmã, ressecada e de uma hora para outra começou expelir sangue, o médico que está tratando dela, disse que todos que fossem ligados a ela, filhos, netos, irmãos, aconselhava que fizessem colonos copia.
- Excelente procedimento. E o que foi diagnosticado na tua irmã?
Câncer, Doutor, câncer Doutor. Já está fazendo radio e quimioterapia.
- E qual o nome do médico que ela está se tratando?
Porra! Doutor, que pergunta difícil. Não sei o nome dele, não.
- E convênio? Ela está fazendo pelo convênio, não está?
Por...! Outra pergunta difícil, só sabe fazer pergunta difícil, é? Não sei. É necessário que o senhor saiba?
- Não, não é, gostaria apenas de saber.
Tá certo, voltando aqui trago o nome do Doutor e do convênio dela.
- Bom, primeiramente para sabermos exatamente o que lhe está acontecendo, é necessário fazer uns exames.
E entre eles, o de colonos copia, não é?
- Exatamente.
Po... Vão introduzir uma câmera no meu ânus, não é?
- Isso mesmo, mas não é caso de se desesperar.
O ânus não é do senhor, não é? Mas tudo bem, para quem já fez biopsia da próstata, a colonos copia é fichinha, não é?
Ele saiu do consultório meio entorpecido pelo sol da tarde. Tudo lhe parecia diferente, com outra dimensão além daquela que ele conhecia. Pisando com firmeza na calçada nova da avenida, atravessou a rua. Chegando ao serviço, jogou na gaveta as guias para os exames, passou a chave e procurou por um tempo esquecer-se deles.


Pastorelli

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