segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

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UM NOME


  Ah, quase não me lembro de quando este bando de letras juntas, dentro das bocas, fazia algum sentido para mim. No início o silêncio é doloroso, mas com o tempo a gente se acostuma, é o que todo mundo diz: com o tempo a gente acostuma com tudo.
Acostumei-me com a falta de um nome pelo qual eu pudesse atender, apelidos ligados ao meu vicio tornaram-se comuns. Mesmo no bairro onde cresci, ninguém mais lembrava o nome que tinha sido meu.
  Quando decidi me mudar, saí de casa para caminhar, as paredes me sufocavam, queria olhar e estar no ambiente externo ao mesmo tempo. Longe, eu mesmo me esqueci de como me chamava e passei a atender por qualquer coisa.
  A garrafa era como um fone que me poupava dos insultos, me livrava da chateação das brincadeiras, que hoje chamam de bullying.
  Relógios e calendários não faziam mais parte da minha rotina, o máximo que eu conseguia era perceber quando era dia e noite, mesmo assim os abusos me adormeciam e a noite que eu via, às vezes, não era a mesma do dia que meus olhos tinham presenciado.
  Deitado na calçada, um toque sutil em meu ombro, terno, respeitoso. Ah! Há quanto tempo não sentia que também era humano e não um animal perdido dentro da massa que me ignorava. Um jovem senhor proferiu um nome, minhas lágrimas caíram, não consegui dizer nada além de obrigado!
  Aquele homem que tinha sido meu colega de escola devolveu minha humanidade ao abrir a boca e parir meu eu de volta para mim.
Hoje, não sei o que mudou, se é que há alguma mudança em mim, não me sinto muito bem, mas ao menos há um eu que pode sentir algo.






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