terça-feira, 9 de maio de 2017

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MAL de AMOR



“... O amor desperta sentidos / inimagináveis e o transforma
em dias de recordações...” (Pedro Du Bois)

Desde daquela manhã, quando revi seus retratos, fiquei inerte, alheia como se o amanhã estivesse distante. Não quero vê-lo. Não vou esperá-lo. Não me despeço, porque ficaria sem coragem e sem a sorte que precisaria para dizer adeus. Nas palavras de Fábio Albuquerque, “... o amor / se revelou um pouco tarde / e ainda fere-me / com o silêncio da fotografia”.
Ele entrou em minha casa, correu sua vista sobre o meu corpo e me fez feliz. Hoje, ainda penso aqui dentro, sem ruídos; sei a dor profunda que sinto. O silêncio não me acalma; há dor no peito sem palavras; então, me surpreendo atrás da porta para não mostrar o sofrimento. Segundo Paulo Monteiro, “há quantos anos não vejo / quem foi meu primeiro amor / hoje só vejo meus sonhos / pelas janelas da dor...”
Minha vida tem se misturado à nossa história. À noite as lembranças chegam e persistem, clareando o amor perdido e sem retorno. Machado de Assis escreveu “Lágrimas não são argumentos.”
De manhã, enquanto caminho, entrego-me à idade e lamento o amor não vivido nas passarelas da luz. Fantasio o meu amor e me desafio nas tardes, com o por de sol ao som do Bolero de Ravel. Então, lembro as cenas, os beijos rasteando o horizonte que se esgota na memória fotográfica. Mário Benedetti expressa, “...com esta solidão /desnecessária / vazia // se pode algumas vezes / entender /o amor”.
É hora de solidão e inverdade sobre a felicidade e de retirar da parede o retrato, como demonstra Mariana Ianelli, “Logo voltas as tuas saudades antigas, / ...Porque és o teu regresso, /nas tuas buscas iludidas / e no teu desamor”. Sozinha, sinto que o amor oferece resposta ao ondular sobre os sentimentos: o mal de amor. É na vista azul que luto contra os sentidos, converso com a poesia e encontro manhãs sem luz. Conformo-me e mal revivo as emoções. Eduardo Martins pergunta, “Quem um dia já não foi / em visita ao seu passado?”
Hoje, tenho vida sem paixão nos minutos de lembranças e nos desencantados dias que passam escuros e falecidos. Gasto o tempo no mal de amor e não tenho mais forças para sentir saudades. Vivo a condição entre a vida e a poeira, como encontro em Américo Conte, “... O que faço sem você? / Os meus dias são de melancolia / e as minhas noites de martírios //... carrego uma angústia no peito / e um vazio no olhar / a procura da tua imagem / que vejo em tudo que é lugar. / E assim me arrasto pelo mundo / magoado com esta vida / que me alijou do teu aconchego / e me fez perder o gosto de viver”.

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