Monotonia
Bruna Maria
Eu o esperei por tanto tempo que pensei ter acontecido algum elaborado e impressionante imprevisto. O tempo alongado em que estive sozinha, o silêncio predominante e o quarto, era quase um apartamento. A cama que engolia o corpo, os pés quando pousavam no chão sentiam a cerâmica gelada. E eu contemplava o teto como quem sofre diante de uma tela branca.
Mas também muito me cheguei à janela, porém nada vendo, recuava. Um assombro tamanho, um espanto daqueles, eu recuava repetidamente e sabia que a demora era fruto de um crime, de um assalto, assalto seguido de assassinato e que, a qualquer hora, o telefone tocaria para que eu fosse reconhecer o corpo de rosto deformado pelas balas.
Houve momento em que ouvi sonoridade do lado de fora da porta, pensei que ele chegava, enfim. A minha espera finda – mas era impressão apenas, tinha muita bruma por fora do vidro da janela e tudo ali era bem lacrado, não sei por que, mas era.
Ar-condicionado supria a impressão de sufocamento, esta é a dádiva da modernidade. E quando ouvi os sons pelo outro lado da porta – na verdade, não os ouvi, pois não existiram. Mas, se tivessem existido, eu saberia que ele estava vivo, e que conversava com alguém, alguém que não sei de onde, e nem como, porque ele sempre me pareceu muito tímido e incapaz de articular um belo diálogo – ou mesmo um diálogo feio – e sempre necessitou de minha destreza, sempre eu a lhe ensinar o que fazer, quando fazer ou por que fazer.
Eu trajava um vestido de espera, que ia embaçando os meus olhos. A cor me dava vontade de morte, porque havia na minha infância uma dona que me contava sobre as nuvens, e dizia que elas eram o lugar para onde iam as crianças quando mortas. Mas sempre que ela começava a contar, eu sentia gelar meu coração. Quanto mais a dona elaborava o espaço branco do infanticídio, menos acesso eu achava ter àquela paz similar ao sono, mas eterna. Suas palavras, a ponte muito corroída pelo tempo em minha reminiscência, faziam aquela espera por ele a minha impossibilidade de atravessar para o céu almejado.
Verdadeiramente não havia nada pelo outro lado da porta, como soube depois. Foi então um instante que eu pensei sair e verificar qualquer coisa que não me lembro, estava muito embaçado e meu vestido pesava, como se estivesse encharcado de água suja. Cansada daquela veste sem sentido, recordo apenas de haver aberto os olhos em algum momento, e a minha espera já estava imprópria, pois ele, afinal e em algum momento, havia chegado.
Fazendo-me carinho nos cabelos e debruçado sobre mim, disse que tinha ouvido vozes dentro do quarto onde eu estava, e julgou que eu recebia alguém. Eu não lhe respondi. A dona esteve a me contar sobre o céu para as crianças – eu teria lhe sussurrado – e eu estive a reviver demônios pelo verbo. Mas ele aceitou o meu silêncio com um beijo em minha testa, terminando com o meu sofrimento, enfim.
Mas também muito me cheguei à janela, porém nada vendo, recuava. Um assombro tamanho, um espanto daqueles, eu recuava repetidamente e sabia que a demora era fruto de um crime, de um assalto, assalto seguido de assassinato e que, a qualquer hora, o telefone tocaria para que eu fosse reconhecer o corpo de rosto deformado pelas balas.
Houve momento em que ouvi sonoridade do lado de fora da porta, pensei que ele chegava, enfim. A minha espera finda – mas era impressão apenas, tinha muita bruma por fora do vidro da janela e tudo ali era bem lacrado, não sei por que, mas era.
Ar-condicionado supria a impressão de sufocamento, esta é a dádiva da modernidade. E quando ouvi os sons pelo outro lado da porta – na verdade, não os ouvi, pois não existiram. Mas, se tivessem existido, eu saberia que ele estava vivo, e que conversava com alguém, alguém que não sei de onde, e nem como, porque ele sempre me pareceu muito tímido e incapaz de articular um belo diálogo – ou mesmo um diálogo feio – e sempre necessitou de minha destreza, sempre eu a lhe ensinar o que fazer, quando fazer ou por que fazer.
Eu trajava um vestido de espera, que ia embaçando os meus olhos. A cor me dava vontade de morte, porque havia na minha infância uma dona que me contava sobre as nuvens, e dizia que elas eram o lugar para onde iam as crianças quando mortas. Mas sempre que ela começava a contar, eu sentia gelar meu coração. Quanto mais a dona elaborava o espaço branco do infanticídio, menos acesso eu achava ter àquela paz similar ao sono, mas eterna. Suas palavras, a ponte muito corroída pelo tempo em minha reminiscência, faziam aquela espera por ele a minha impossibilidade de atravessar para o céu almejado.
Verdadeiramente não havia nada pelo outro lado da porta, como soube depois. Foi então um instante que eu pensei sair e verificar qualquer coisa que não me lembro, estava muito embaçado e meu vestido pesava, como se estivesse encharcado de água suja. Cansada daquela veste sem sentido, recordo apenas de haver aberto os olhos em algum momento, e a minha espera já estava imprópria, pois ele, afinal e em algum momento, havia chegado.
Fazendo-me carinho nos cabelos e debruçado sobre mim, disse que tinha ouvido vozes dentro do quarto onde eu estava, e julgou que eu recebia alguém. Eu não lhe respondi. A dona esteve a me contar sobre o céu para as crianças – eu teria lhe sussurrado – e eu estive a reviver demônios pelo verbo. Mas ele aceitou o meu silêncio com um beijo em minha testa, terminando com o meu sofrimento, enfim.
2 comentários
Bruna, a escrita é um ato solitário e causa intensa sudorese.....rs
Escreva sempre!
Bjs
Belvedere
Tem razão, Belvedere! Ainda assim, não paramos de escrever... (que bom!) Beijos!
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