Abri a terra com uma folha de papel
adubei-a com tinta utópica
e semeei um canteiro de letras
Com o juízo em pedra-de-cevar
reguei-o com pó de frases alegóricas
o orvalho de alguns neologismos
o suor de metáforas em artefacto
e deixei o canteiro a matutar.
No meio do verão saíram algumas letras esdrúxulas
umas virgulas e uns embriões de acentos.
Sentia-se no ar aquele perfume sinonimado
e o ténue vagido duma singela ária a brotar.
Mas ainda não dava para decifrar a colheita
eram curtas gnoses na crista de tês minúsculos
que nem dariam para uma simples apostila.
Cobri o canteiro com uma nuvem de tiles.
Depois de o ventilar com um lacónico tempo do norte
misturado com o safanão da ardência do sul
e recolhi à minha vida de ingénuo trovador.
Chegou o Outono e ouvi umas letras a soar
por entre as folhas mortas erguendo-se afoitas
correndo joviais para a folha de papel
onde se escreveram em versos genuínos.
Theófilo de Amarante ( Fernando Oliveira )
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Abrir a terra. Eis o segredo de onde afloram confluências e divergências. A terra nua e pura: versejar. Parabéns, Fernando, pelo poema. Abraços, Pedro.
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