terça-feira, 8 de junho de 2010

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Cansaço (Patricia Amorim)


O que me limita é esse cansaço. 
Cansaço das coisas bobas da vida 
e das importantes não-vividas. 
Cansaço de ter hora, de passar da hora, de viver sem hora. 
Cansaço de saber o que é isto ou aquilo, 
se fará sol ou chuva, se me arrisco ou fico parada.
Cansaço, puro cansaço.
Cansaço de ter mais sentimentos e menos sentidos.
Cansaço dos desentendimentos insuportavelmente longos,
dando ao tempo a responsabilidade de resolvê-los.
Coitado do tempo, esse velho senhor que tudo resolve quando passa e que às vezes passa e nada resolve.
Cansaço de ser avaliada sem critério, dessa onda de mistério.
Cansaço de não acreditar.
Cansaço familiar – essa corrente umbilical que estica e afrouxa em um ioiô de sentimentos confusos.
Cansaço de ter que ser melhor, igual,
cansaço de ser menor.
Cansaço, tanto cansaço...
Cansaço de guardar na memória tudo o que não posso mais viver, essa mania de nostalgia que me mata de dor e de prazer.
Cansaço que só não pode me tirar o ofício de escrever,
pois não saberia mais como viver.
Ah cansaço, um dia me levarás,
E aí, descansaremos.

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