XI
Após a saída dos policiais, Clarissa fechou-se em casa novamente. Não tinha nenhuma vontade de sair. Sempre que saía alguém lhe abordava e queria transar com ela. Não importava se era jovem ou velho, a meta deles era a mesma. Todos eles, sem exceção, eram casados. Por que os homens casados fazem isso?
A dor de cabeça aumentava dia a dia e a dor no peito também. Quando se lembrava de Maurício o coração doía muito. Toda hora lembrava dele. Nem podia ser diferente. O apartamento fora feito e decorado pelos dois juntos. Tudo o que havia ali fora os dois que colocaram. Todas as peças eram a imagem do casal. Era uma festa quando conseguiam comprar algo mais bonito para enfeitar um canto qualquer. Nada fora comprado em separado, os dois estavam sempre juntos no ato da escolha. Por onde quer que ela olhasse, Clarissa via Maurício.
Sua dor foi aumentando.
Certo sábado, Clarissa nem lembrava mais as datas, Neuza sua amiga da faculdade veio visitá-la.
- Bom dia menina!
- Bom dia Neuza, entre!
- Como você está?
- Estou bem!
- Estava preocupada com você e vim ver se precisa de alguma coisa. Quanto tempo faz que você não sai daqui de dentro?
- Algum tempo. Nem sei!
Neuza entrou na cozinha e abriu a geladeira. Havia pouca coisa lá dentro.
- Você está magra, com a pele macilenta. Tem se alimentado direito?
- Acho que sim!
- Como acha que sim?
- Nem sei! Como alguma coisa quando estou com vazio no estômago!
- Minha querida amiga! Assim não se resolve nada! E se Maurício aparecer e ver você desse jeito? Vai pensar todo vaidoso que você está se destruindo por causa dele. Os homens são egoístas e ficam felizes ao nos verem sofrendo por eles. Preste atenção! Nenhum homem merece nosso sofrimento! Muito menos Maurício que a traiu tantas e tantas vezes.
Clarissa fechou os olhos e viu o corpo do marido baixar nas águas.
- Vamos! Levante daí e vamos sair. Vamos ao shopping. Deve haver alguma coisa que você queira comprar, ou apenas olhar as vitrines. Isso já levanta o astral.
- Não obrigado! Prefiro ficar aqui sozinha!
- Clarissa! Você é a mulher mais inteligente que conheço e sabe que isso é depressão da braba. E depressão feminina se cura fazendo compras. Vamos lá. Tomaremos um sorvete com cobertura de chocolate. Ou comeremos um belo crepe com morangos.
Enquanto falava Neuza foi ao armário e pegou um vestido bonito e colocou em cima da cama desfeita. Abriu a janela do quarto para ventilar. Foi até a sala, pegou Clarissa pela mão e a levou até o banheiro. Tirou sua roupa enquanto ela choramingava como criança doente. Abriu a água e a empurrou para baixo do chuveiro. Passou o sabonete e dizia:
- Vamos! Lave-se! – e saiu para o quarto onde separou alguma maquiagem para dar brilho ao rosto macilento da amiga.
A água escorrendo pelo corpo de Clarissa foi lhe abrindo a mente. Começou a passar o sabonete e esfregar. Foi esfregando devagar a princípio, depois com mais vigor até que começou a ficar com cores nas faces. Saiu do banho com outra fisionomia. Enxugou-se rapidamente passando a toalha com força pela pele. Saiu do banheiro, procurou a roupa e vestiu o que Neuza havia colocado na cama. O quarto já não cheirava tão ruim com a janela aberta.
- É isso aí amiga! – falou Neuza.
- Obrigado Neuza! Estava precisando disso.
- Sei que estava! Nada de depressão. Nada de se entregar para a tristeza. Homens vão e vêm. Todos são iguais, todos uns cafajestes.
- É! Eu que o diga!
E lembrou-se dos corpos caindo na água azul esmeralda do alto mar. Olhou pela janela o sol que brilhava na manhã quente. Que bom morar em um país tropical. Sempre haveria sol e calor por mais que fosse agosto.
- Estamos no mês de agosto?
Antes de responder Neuza olhou penalizada para a amiga.
- Sim! Estamos.
- Que dia?
- Doze de agosto.
- Dez meses que estou sem meu marido.
- Sem o cafajeste de seu marido você quis dizer.
Clarissa olhava pela janela e via as crianças brincando lá fora. Mauricio nunca quisera filhos. Quase nove anos de casados e ele sempre resistindo à idéia de tê-los.
- Será que seria bom ser mãe?
Neuza foi até a janela e olhou para baixo onde os peraltas faziam traquinagens.
- Sei lá amiga! Nunca os tive!
- Mas você nunca quis casar!
- E vendo você nesse estado de ânimo, acho que vou continuar com a mesma idéia até morrer.
Clarissa olhou para a amiga e lhe deu razão mentalmente. Melhor fora nunca ter se casado. Nunca ter se apaixonado.
- Está bem! Vamos ao shopping. Mas previno-a que estou com pouco dinheiro e nada posso gastar.
- Para nos divertirmos não é necessário dinheiro. Basta algumas moedas para um sorvete. Vamos lá.
Passaram horas no shopping e Clarissa ficou com fome.
- Vamos voltar, estou com fome e aqui é muito caro para comer.
- Nada disso! Eu pago, vamos comer aqui mesmo.
E puxou a amiga pela mão como se fosse uma criança e a levou para a praça de alimentação. Rindo de tudo as duas procuraram uma mesa e acomodaram-se. Um garçom bem apessoado e gentil aproximou-se com um cardápio.
As duas pareciam crianças em dia de véspera de Natal. Riam de tudo. O garçom sério as esperava em pé. Após escolhido o jantar ficaram falando sobre alunos e colegas de trabalho. Neuza procurava diplomaticamente não levar o assunto para os lados perigosos das lembranças da amiga. Falava de amenidades acontecidas recentemente na faculdade. Isso fazia Clarissa rir.
Já tarde da noite saíram do shopping e Neuza deixou a amiga em casa mais tranqüila. Ficou feliz por ter feito o papel de terapeuta improvisada com ela.
Clarissa já estava sorrindo.
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