Este folhetim é uma adaptação de trechos do Livro Dezessete anos, editado em 2008.
Capítulo I
Sara e Miguel eram figuras exóticas e de presença constante nas praias daquela bela cidade da Bahia. Ciganos vindos da Espanha ainda crianças, moravam próximo aos Rochedos em um barraco de lona de caminhão.
Sara dançava e lia as mãos dos turistas, e Miguel vendia quinquilharias em uma enorme arara onde havia de tudo: chapéus, cangas, bijuterias, bonés, lembrancinhas, entre muitas outras coisas. Inutilidades, como diria minha mãe.
Conheci os dois eu era ainda muito pequena. Hoje estou com dezessete anos e tenho um namorado. Acostumei a vê-los sempre que ia por lá, pois os dois belos ciganos não faltavam nunca pela orla.
Um dia deste meu namorado Renan levou-me a um local lindo na beira do mar. Deixamos o carro estacionado em frente a uma casa bonita, e subimos a pé por um caminho de pedras que levava até ao farol lá no alto. O dia estava muito cheio de sol, e o calor da tarde era grande. Fomos devagar olhando as plantas pelo caminho, algumas flores aqui e ali. Já no alto, a beira dos rochedos, ficamos embevecidos pela maravilhosa paisagem que se descortinava à nossa frente. Um navio muito ao longe, barcos de pesca e outros de passeio deslizavam nas águas esverdeadas do mar lá embaixo, e na cidade mais ao longe as casas e prédios pareciam um cartão postal. Para qualquer lugar que se olhasse a vista era assombrosa. Como nunca havia pensado em subir aquele caminho do farol antes? Lembro que desde pequena via crianças subindo em algazarra aquele caminho que fizemos hoje. Mas nunca tive a curiosidade de ir com eles. Que boba fui! Na verdade, quando era criança, ajudava meus irmãos a vender picolé, algodão doce e outras coisas na praia, e não sobrava muito tempo para brincar.
– Vanessa! Olha aquela cigana! – falou Renan.
Virei depressa para olhar. Era Sara. Fiz um sinal com a mão e ela se aproximou.
– Olá Sara! Lembra-se de mim?
– Olá! Lembro sim. Você sumiu da praia.
– É! Arrumei um emprego fixo. E o Miguel?
Sara virou para o lado. Miguel estava sentado em uma pedra que de tanto ser usada como banco já parecia um. Ela fez sinal para ele se aproximar. Renan com um sorriso estendeu a mão num cumprimento sem palavras, mas amistoso.
Ficamos a conversar sobre muitas coisas. Lembramos de quando eu vendia sorvete na praia com meus irmãos, e eles dois andavam por ali também ganhando a vida. Contaram que passavam todo o tempo naqueles sítios, e que o farol fazia parte de sua vida.
O tempo passou rápido conversando, e já era quase noite. Então resolvemos voltar. Quando descíamos pelo caminho de pedras, vimos uma moça bonita sair da casa onde o carro de Renan estava estacionado em frente. Ela passou por nós rapidamente e subiu pelo caminho que acabamos de deixar. Renan falou:
– Conheço essa moça! Já a vi na faculdade e ela é muito popular por lá.
Olhei para Renan que acompanhava a subida da moça pelo caminho pedregoso e fiquei com ciúmes. Quem não ficaria? A moça era bonita de verdade! Mas nada falei de meu ciúme. Mamãe nos ensinou que muitos relacionamentos terminam porque o ciúme deteriora os sentimentos, e cria fantasmas inexistentes. Então deixa pra lá! Confio em Renan!
Por nós passou um carro vermelho, seu motorista acenou para Renan.
– Quem é? – perguntei.
– Um colega de sala. Faz direito comigo! O pai dele é juiz de direito ou coisa parecida. A mãe é de uma família muito rica. Ele é figurinha premiada.
– O que isso quer dizer?
Renan riu e não respondeu. Fiquei quieta. Perguntaria a um de meus irmãos o que significa ser uma figurinha premiada. Sou curiosa, mas não quis demonstrar muita burrice insistindo com ele. Mais tarde fiquei sabendo que ‘figurinha premiada’ seria algo difícil de se encontrar.
– Vamos comer alguma coisa lá em casa antes de irmos para a sua?
– Vamos! Estou mesmo com fome.
E nos dirigimos para o prédio onde Renan morava.
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