domingo, 19 de dezembro de 2010

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A ARTE DA DEDICAÇÃO (Jean Pierre Barakat)



Quando ouço a palavra dedicação, apenas dois exemplos históricos surgem em minha mente: Jesus e uma mãe. Ora, não há como dissertar sobre os divinos méritos e atributos do filho do Pai, pois ele é Perfeição, à semelhança do Criador, e não há criatura na Terra que foi, que é ou será idêntico a ele. Resta-me, portanto, o exemplo mais humano, e não menos meritório de louvor e prece, do ser que marcará para sempre a história da humanidade por possuir o dom inato da vida e do amor incondicional: a Mãe.

Digo mãe, e não mulher, porque ser mulher não é uma opção: nasce-se assim, determinado pela genética. Mãe, no entanto, é escolha. É um ofício que não termina com o parto. Ingrato, porque nada espera. Altamente recompensador, porque desperta automaticamente cada sentimento, cada instinto, e multiplica todas as sensações. Nenhuma experiência que eu conheça se compara à sensação de ser mãe. Desde a concepção, passando pelo período de gestação até o parto e mais além. São cheiros, graças, toques, olhares, as primeiras urinas e fezes, a suave expulsão de gases pelas vias possíveis precedidas de choros copiosos e acompanhadas de sorrisos marotos de alívio em seguida, e finalmente aquele sono gostoso, restaurador, no peito da mãe após sugar toda a seiva da vida. Não me delongarei sobre todos estes prazeres, e outras delícias afins da alma, por não ser este o objeto do meu pequeno ensaio sobre a dedicação. Ressalto apenas o exemplo da mãe como ideia suprema de dedicação para com outro.

A dedicação não é um ato fugaz, como um poeta dedicando um canto de amor para a sua amada ou musa em um momento de inspiração, e nem se parece à atuação de um servidor público no exercício de sua função – que pode até ser vocação de vida, mas que é remunerada, ou até a atuação de um médico, zelando pela saúde de seus pacientes. Não me levem a mal, são estes atos louváveis, porém carecem dos componentes de incondicionalidade e gratuidade, até de certa alienação voluntária, necessária do ego.

A dedicação não cobra, ela simplesmente executa. A dedicação é um caminho reto, sem atalhos. Não permite que olhemos para trás, quando ela atua. Senão, seríamos literalmente petrificados ao olharmos a Medusa beleza – ou imperfeição – de nossos atos. Escrevemos e gravamos, na alma do mundo, a nossa dedicação com a tinta de nosso suor e sangue. Não nos cabe julgar ou querer saber a repercussão desse belo gesto. Seria como querermos decifrar um milhão de pensamentos em um segundo. Assim, a dedicação não se discute, apenas se faz.

Pode ela ser silenciosa, viver de intervalos e de hiatos necessários. Ela atua em nós somente quando existe o Amor. Pois é, são almas gêmeas, duas unidades se revezando no tique-taque das horas, uma suavizando o nosso ser, outra potencializando o nosso despertar. Dedicar-se ao outro tem essa busca incessante, constante na direção do elo adormecido da nossa essência primeira, em todos os momentos da nossa existência, essência, esta, que encerra em si a generosidade, o desprendimento, a incondicionalidade e a humildade que nos torna todos iguais e humanos.

A dedicação, por fim, não tem identidade mas identifica a todos. Serve a todos, sem discriminação. É mestra de si própria. Convido-vos, a partir deste momento, a sentir o seu poder através da prática diuturna desta arte inata em nós. Sabe-se lá se que o mundo não comece, a partir desse gesto, a se inclinar majestosamente às próximas gerações.

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