quarta-feira, 21 de setembro de 2011

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A NASCENTE 21 - JANDIRA ZANCHI


A NASCENTE 
I -  ASCESE
21.
-         Portanto, Aboé, a transmutação da raça deve seguir dois princípios: a abstração colada ao Carro de Apolo e à expansão dionisíaca, e o domínio dos processos inconscientes, visto que o todo de si excede em muito a consciência de si.
-         Para mergulharmos adequadamente nas correntes aéreas que flutuam, diáfanas e vigorosas, nas límpidas águas, precisamos nos desarmar de nossos processos de defesa.  O medo e a agressividade que norteiam o primata em sua luta na selva e que são a espada do guerreiro transgressor, podem ser o muro do santo alado à viagem virtual.
-         Para erguer-se até o deus libertador o homem deve transformar-se em perito navegador. Chamar até si os sensores que desconhecem o espaço material.
-         Só o ser alado conhece as freqüências da grade magnética por onde desabam os altares da leveza. Sustentar o instrumento, jamais desafiná-lo, fazer música de sua alma e não corrompe-la nas rígidas leis da formação da matéria, é uma exigência para aquele extraído, nubente e virgem, dos ditames do espírito.
-         E por que pessoas como nós, que já nos trouxemos imersos no líquido de leite diáfano, ainda assim esbarramos nos intervalos ?
-         Mesmo a extensão tem seu limite. Talvez algumas vezes não saibamos a que viemos ou em que ponto nos situamos. É reconhecer as desvantagens e libertar-se para o recomeço.
-         Reassumir a criança em sintonia com as variações do raio de Sol na laje do pátio. Harmonizar-se até o vôo do céu.
-          Existe um Cálice, quando ele derrama um líquido de veludo, flores negras de paixão cobrem a terra. O branco do primeiro princípio diluí a força em três átomos, sem par ou ímpar, sempre plural no singular, ergue o Centro em novo altar.
-         Aguardar-se o pouso branco. Ele te reconhece e inicia a nova colheita.
-         Pode ser simples assim, Margri, se você souber manter-se à superfície das águas, enquanto elas se desvairam em suas torrentes. Para devolver o Cálice ao povo já se aproxima, advindo da floresta alta, o iniciado no poder dos sacerdotes negros e nos mantras do Arquétipo do Cálice Escuro, que traz nas fímbrias das vestes as virtudes da correta ação e sua força. Esse homem conhece as fadas e duendes da mata até a exaustão de suas ervas curativas e seus segredos anímicos. Saberá domar a serpente munido do espelho das suas seduções.
-         E eu...
-         Margri, que amou a tantos homens, enfim conhecerá o amor. Cabe à deusa das fadas convocar os instrumentos. A floresta, pela sua exuberância de frutos e flores, de luxuriosas ninfas adormecidas em seu veio, de águas cristalinas em suas fontes, exige a plena satisfação de seus elementos. E se renderá  antes a um príncipe, do que a um santo.
-         Aguardo o princípio do chamado.
-         Já se faz ouvir na Clareira aberta ao pouso da Ave. E que ele traga em seu anel um grande gorjeio de águas, que em seus olhos se divisem as mais altas nascentes, pois nunca poderemos impor uma imagem ou uma razão. Para aquele que se confere o altar dos louros é presto em homenagens o coro
-         .Ao altar dos ancestrais de meus deuses dirigirei a prece do Chamado. Que ele se faça homem e amor é bonomia por demais conveniente dos frutos da terra. Tenho dirigido com labor e paciência a dança dos humanos da Nascente. Muitas vezes mirei-os em águas turvas e insólitas. Será suave o percurso decorrido junto a outra parte de minha alma.
-         Margri é a deusa apolínea, fornecida no ouro, e o deserto é campo a muito vencido. Conquistou a boa disposição do Senhor do Centro ao frutificar seu ventre de filhos sadios e levitados. Para não perde-la e agradá-la de seu mais majestoso rebento, oferece-lhe o filho dileto, o Apolo moreno, aquecido em terras de fogo e gratificado pela rocha bruta dos melhores contornos de sua seiva.
-         Sou eterna aprendiz e não tropeçarei na soberba mesmo que a vida me confie a tarefa dos mestres. Que se anunciem nessas matas as trombetas da Era de Ouro e Ar, saberemos louva-las nas correntes unas do primeiro ser. Assumiremos a valentia da sina e agradeço ao Gênio da Mata o préstimo do Príncipe. Na Clareira aguardaremos o pouso do Carro da Águia.

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