terça-feira, 18 de outubro de 2011

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Os Caminhos de Laura - Capítulo LIII


Para distrair minhas mágoas fui visitar amigos e parentes naquela cidade do interior no sul do país, onde morei por tanto tempo.
Passeando na rua encontrei o Dr. José. 
Incrível! De cabelos grisalhos parecia ainda tão bonito quanto era quando nos conhecemos. Mas não parei para conversar, apenas acenei um cumprimento.
Naquela noite descansando no hotel, recebi um telefonema.
- Alô! - disse ao atender ao telefone.
- Alô! Como vai? - dizia uma voz macia e delicada do outro lado.
- Quem fala?
- Puxa! Foram tantos anos que não conhece mais a minha voz? - a voz parecia triste do outro lado do fio.
- Bem! Se disser quem é, ficará mais fácil conversarmos. – falei decepcionada, pois esperava que fosse Luan.
- José! - a voz parecia estar cansada.
- Ah! Olá Dr. José!
- Espero não estar aborrecendo-a.
- Não, por certo!
- Faz muito tempo, não?
- Sim! O senhor desapareceu por muito tempo mesmo!
- Liguei para ver como você está. Se está feliz.
- Sim, estou muito feliz!
- Que bom! Espero que continue assim. Foi um prazer imenso vê-la na rua hoje de manhã. Você pode não acreditar. Mas fiquei tão feliz que passei o dia todo sorrindo e pensando em seu rosto ao me cumprimentar.
- Você sempre foi gentil.
- Espero poder vê-la. Aceita almoçar ou jantar comigo?
- Fico pesarosa por ter que recusar, mas tenho alguns compromissos a cumprir antes da viagem, e não poderei aceitar. Fica para outra ocasião.
- Está bem. Entendo. Seria muita felicidade você aceitar!
- Desculpe! - disse sem muita convicção.
- Não tem por quê. Espero poder encontrá-la um dia para podermos conversar.
- Até um dia então! - disse eu para encerrar.
- Até logo! Estarei pensando em você.
Coloquei o fone no gancho e fiquei segurando-o enquanto pensava: "O que o teria feito ligar?"
Uma amiga que visitei durante o dia havia falado que o Dr. José estava só. A mulher com quem casou deixou-o com uma filha pequena, a menina tinha só dois anos quando ela fugiu com outro homem.
- Dizem que ela mora na capital. Também! A moça é vinte anos mais jovem que o Dr. José, não podia dar certo mesmo – falou minha amiga com convicção.
- Idade não tem nada a ver, minha amiga!- falei - Quando alguém ama de verdade, ama sem ver cor, raça, religião ou defeitos. Para quem ama, a pessoa objeto de seu amor é perfeita. Com certeza ela não o amava de verdade.
- É talvez! Todos falaram quando ele ficou sozinho, que era castigo por abandonar você.
- Nada disso. Tudo o que acontece na vida das pessoas, acontece por que elas criam os acontecimentos. Não existem castigos divinos ou não. Somos nós que sofremos porque queremos. Sempre que quisermos deixar de sofrer, é só abrir os braços e receber no coração a luz de Deus. (como fiz várias vezes em minha vida) - pensei.
Dois dias depois do telefonema de José, voltei para casa.
Passado um mês, com surpresa recebi em minha casa um cartão, que dizia:
"Querida Laura.
Fiquei por dezesseis anos curtindo a culpa e o arrependimento de tê-la deixado sem nenhuma explicação, nem sequer um telefonema para dizer de minha covardia ao deixá-la por alguém que nem de perto tinha suas qualidades e sua postura. Só depois de sofrer na carne a decepção de uma traição e de um abandono, vi que o meu sofrer não era por ter perdido uma esposa, e sim por não ter sabido segurar a única mulher que mereceu de fato meu coração. Percebi quando fiquei só, que amor mesmo foi o que senti por você, e que sinto até hoje, pois o verdadeiro amor nunca morre. Sei que você é feliz. Não podia ser diferente. Você merece. Mas peço em nome do amor que sinto por você, se um dia pensar em mim, pense com carinho. Amo você hoje, tanto ou mais que amava antes. Estarei sempre aqui pensando em você.
Com muito amor,
De seu
José."

Embora seja lisonjeador receber algo desse naipe, não senti nenhuma alegria nem tristeza. O Dr. José morrera em meu coração há muito tempo.
Que pena! Hoje posso apenas rezar por ele. E olhando para o céu estrelado, vejo em pensamento um homem caminhar sozinho ao encontro do destino que ele mesmo escolheu.

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