A DANÇA DOS ARCOS - A ÁGUIA DE OUR0
I - A PASSAGEM
3.
A brisa do fosso levantava-se, indômita, gargarejando sua ansiedade. Marian iluminou-se em um suspiro. A majestosa amplidão do Observatório da Águia de Ouro continuava a provocar náuseas em seu coração. Ali vivera os mais gloriosos anos de sua vida, aqueles em que se deixara conduzir pela mão de Atílio, sendo sempre uma luz na espiral do vôo da Águia. Quando se enfiavam as madrugadas, sem embuste ou logro, no verniz do coro das estrelas, a sacerdotisa, no transito daquela lucidez, retornava às saudades do vento da planície, das gargalhadas douradas dos prazeres do Sol nas festas da deusa.
Perdia-se no tempo o número dos anos do feitiço do canto do bruxo, enamorando-a da sombra púrpura de suas estrelas. Desde então fora amante e aprendiz de Atílio, residindo em seu Castelo, a 7ª casa do magneto, cavado por cima do fosso na derivação do Controle da larva. Muitas vezes quisera abandonar aquela vida, que se coberta de luxo e poder, não a libertara de grandes nostalgias da leveza e leviandade das alegorias do povo.
Recitava, com prumo, as lições da primeira via, aquela que unira as estrelas gêmeas para encaminhar o espírito ao terceiro degrau. A estrela dera-se devida conformação, harmônica no interior e no exterior. O louro, Amadeu, o Rei dos Capitães, após vencida a batalha dos vinte e sete, cegara os homúnculos com sua seqüência principal, enquanto o moreno, Atílio, arrancado dos azuis primordiais, era aliado da paz e da evolução, deitando na plebe o seu olho agudo e aguado do conhecimento dos humanos.
Nos seus muitos estudos aprendera as estórias dos sete príncipes negros que em torno do grande fosso recitavam o poder do Portal com as raízes e o Cosmo. De tais artimanhas só restaram duas, e se Atílio era a costumeira face da sétima empreitada, a primeira, para aonde se abriam os portões da nave até os confins do espaço, era reduto do Guerreiro, Amadeu.
As valentes horas da madrugada acabavam por serenar o corpo da deusa que, no lamento da noite, era novamente a sacerdotisa de fogo e água dos guerreiros de Dionísio.
- Atílio... – sussurrava, e a lembrança do amado desfazia os nódulos do peito.
Lágrimas armavam-lhe o corpo quando amanhecia em seu leito, novamente afeito àquela longa resistência. Era muito próximo o dia de rever o homem amado que partira em busca de meditação e seiva no deserto dos Arcos. Não fora consumida a consecução da partilha mas eram muitas as medições de terreno até a reza da vidência. E Marian temia tanto o fim do enlace com o Bruxo, que na Ascese não a retomaria, como a consumação do seu destino, a dança no deserto como a terceira face da Águia. Só assim, repetiam-lhe, à exaustão, os Mestres, se libertaria para o sonho da leveza no fogo, na água e no ar.
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