A DANÇA DOS ARCOS
1.
Era cálida a noite no deserto. Brancas e sem imposições as estrelas nadavam lentas, deslizando sobre os solos despidos de fantasia. Não se perturbavam do discurso dos homens e, exiladas de seu canto, permaneciam vãs e vácuo pôr entre as sombras da criação.
Atílio e Amadeu haviam armado suas tendas e aqueciam a fogueira dos primeiros versos.
- Sem dúvida inicia-se por essa imagem – disse Atílio.
- É sempre aqui que aporto quando empunho as ondulações – concordou Amadeu.
- Ao longe espia-nos o vazio.
- É lento e coerente. Resumiu-se para que se adivinhe a senda de chegada.
- Já não me ocorrem as brusquidões do tempo.
- Esqueci o brilho das armas. Enfeitei-as, mas são mais nítidas as marcações do espírito.
- Porém se observarmos, logo ali, se eleva, chegando ao norte, um pico com seus gumes, dourado de lua.
- Vejo-o aproximando-se. É fato que deserta da areia fria dos outros feitos.
- Parece movido de algum espanto.
- Ou esperança...
- Já não supunha reconhecimento...
- Talvez farto de longo silêncio.
O fio de lua que ainda se encorajava de mover suas marés na areia deitou alguma forma na tez pálida. Eram sombras vagas, vadias e presas, quase nada, quase nuas.
- Movem-se de alguma coisa – suspirou Amadeu.
- Por algum motivo – continuou Atílio.
- Ainda nas veias a recordação da vida...
- Pequenos espasmos de luxúria.....
- Não se estimam aos nossos brios.
- Estão roucas por se deitarem.
- Mas antes escondem o vale das sombras.
E esqueceram-se delas. Erguiam os cumes mas não levavam o vento. As horas sucediam-se sem esperanças. O calor levantou algumas bordas de cor quando começou o dia.
- Mesmo o astro aparece sem bravura – observou Amadeu.
- Cheio de cãs e supostas melancolias. Não agradece por iluminar terra tão infértil.
- Talvez esquecido de aonde mora a abertura.
Dormiram ao abrigo da aridez. Quando acordarão já começava o ensaio dos signos. Era visível a esperança derramada do carrossel do primeiro astro.
- Amam por fim – suspirou Atílio.
- Cortejam.
- Querem enredar-se.
- Dar ensejo.
- Já apostam a demarcação.
- Posso vê-la nua e ácida, guardada ao marido e prenhe dos valentes.
- Anseia por fornecer-se.
- Não tarda em revelar-se.
- Porém, ainda suspeita...
- É namorada cheia de escusas... desvirtuou-se, foi desvalida....
- Sobre ela marcharam vis soldados.
- Mas saberá reconhecer seus príncipes.
- Enviemos-lhe as primeiras prendas.
E deixaram que o deserto se povoasse de pétalas e frutos. Que as marés se conviessem aos arroubos até encontrarem o perfume do canto. Eram tantos os dias..
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