quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

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A dinastia do sangue

Ainda me sabem a caramelos
os velhos beijos das avós
que viviam viúvas dentro do casamento
porque os maridos morriam sem dever morrer
ou se desterravam para viver sem viver
longe dos berros da miséria.
... Viviam nas infamantes pedreiras dum país sem língua
... ou na luxúria duma sorte malfadada.
Vejo-me criança que não sabe compreender
a precoce velhice daquelas damas caturras
que se vestiam de mulher duas vezes em cada ano.
Natal e Páscoa.
Sabe-me a pouco aquela promiscuidade latente
que diferenciava a fria autoridade dos pais
com a doçura de velhas-jovens.
... Mais mães do que avós
... Mais crianças do que adultas
Avótriarcas
que sustentavam os meus sonhos com lendas toscas que saiam duma memória parada.
Vejo-me criança que sabe compreender
a solidão daquelas jovens-velhas
... Mais amigas do que mães e avós
que se sustentavam com um valor emérito.
... O sorriso do neto que recebe um rebuçado.
Vejo-as agora que sou grande
pai e avó
circulando à minha volta para me oferecer o rebuçado
que ainda não dei aos meus netos.

Elas não souberam que tive filhos ou netos
mas souberam que o sangue duma família é doce.

(AEC) Antanho Esteve Calado

1 Comentário

andre albuquerque

Excelente, a busca de um tempo não perdido.Abraço,André