quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

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Roberto Carlos: trocado na ditadura?


Roberto Carlos Braga, o quarto e último filho do casal Robertino Braga e Laura Moreira Braga, nasceu ao décimo nono dia do mês de Abril de 1941 em Cachoeiro de Itapemirim – cidade do Estado de Espírito Santo.
Iniciou sua carreira solo como cantor na boate do Hotel Plaza, em Copacabana, cantando samba-canção e bossa nova. Começou a fazer sucesso com suas versões do rock’n’roll americano e composições próprias em parceria com o amigo Erasmo Carlos.
Roberto Carlos foi um ídolo da juventude na década de 1960, líder do movimento da Jovem Guarda – o primeiro movimento de rock genuinamente brasileiro. Na década de 1970, reformulou o seu repertório e se tornou um típico cantor e compositor romântico.
Sua popularidade o tornou conhecido no Brasil e na América Latina como “O Rei”. Já vendeu mais de cento e vinte milhões de cópias de seus discos, lançados anualmente próximos à época de Natal. Continua se apresentando anualmente num especial da Rede Globo que vai ao ar nessa mesma semana.
É óbvio que ter como aliado um líder desse porte é conveniente a qualquer regime político totalitário ou classe dominante. E reza a lenda popular que a Ditadura Militar deu cabo do Roberto Carlos original, tendo-o substituído no ano de 1971 por outro interprete, menos talentoso e com o rosto mais quadrado. Daí o fato do álbum “Roberto Carlos” do ano de 1971 ter sido o único em que o cantor não aparece na capa em foto legítima, mas sim retratado em arte gráfica relativamente simplista.
O álbum “Roberto Carlos” de 1971 contou com arranjos sofisticados, assinados pelo maestro Jimmy Wisner. Apreciemos esta obra-prima em seus “detalhes” e minúcias.
LADO A
Faixa (1) "Detalhes"
“Não adianta nem tentar / Me esquecer / Durante muito tempo / Em sua vida / Eu vou viver...” / ... / “Eu sei que esses detalhes / Vão sumir na longa estrada / Do tempo que transforma / Todo amor em quase nada / Mas ‘quase’ / Também é mais um detalhe / Um grande amor / Não vai morrer assim”
Faixa (2) "Como Dois e Dois"
Música de Caetano Veloso gravada por Roberto Carlos (para justificar "Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos"?). Perceba a ironia na letra de Caetano.
“Meu amor! / Tudo em volta está deserto / Tudo certo / Tudo certo como / Dois e dois são cinco”
Faixa (3) "A Namorada"
Carlos de Carvalho Colla, nasceu no ano de 1944 em Niterói, no Rio de Janeiro. Carlos Colla, como era chamado, tinha o sonho de ser advogado e, durante anos a fio, bancou os seus estudos se apresentando como músico na noite carioca. Mais tarde, convidado por Maurício Duboc, passou a integrar o conjunto “O Grupo”. Essa música, “A Namorada”, é uma das primeiras composições da parceria de sucessos Colla e Duboc, tendo Roberto Carlos gravado por volta de quatro dezenas de suas canções! Carlos Colla graduou-se em direito no ano de 1974. No ano de 1980, ele trabalhava na OAB e presenciou triste episódio que marcou a história política do Brasil: a explosão de carta bomba na sede da OAB no Rio de Janeiro que veio a vitimar a também funcionária Lyda Monteiro da Silva. Este evento, (coincidentemente,) colaborou para o encerramento prematuro de sua carreira como advogado.
“Você, que renasceu do meu segredo / Do meu sonho, do meu medo / Do meu verso e da verdade derradeira / Você a companheira / A namorada à minha espera / Meu refúgio, meu regresso, minha vida, meu amor / Você, uma lembrança, uma esperança / O sonho mais bonito que viveu pra se acabar”
Faixa (4) “Você Não Sabe o Que Vai Perder”
“Diz que eu nada faço por nós dois / Que venho uma semana / E só um mês depois / Eu volto pra lhe ver / Você não pode compreender / ... / E sinto muito / Mas eu sou assim / Sei que cedo ou tarde / Alguém vai lhe dizer / Se você me deixar / Não sabe o que vai perder”
Faixa (5) "Traumas"
“Meu pai um dia me falou / Pra que eu nunca mentisse / Mas ele também se esqueceu / De me dizer a verdade / ... / Da realidade do mundo / Que eu ia saber / ... / Alguma coisa que na alma / Conseguimos sufocar / ... / Às vezes as mentiras / Também ajudam a viver”
Faixa (6) “Eu Só Tenho Um Caminho”
“Vou mudar meu rumo / (Assim me acostumo) / Só se vive uma vez / (Ou menos de um mês) / ... / Vou seguir meu caminho / Vou seguir, eu vou / E vou mudar...”
LADO B
Faixa (1) "Todos Estão Surdos"
Este é o segundo registro de cunho religioso na carreira do cantor (o primeiro foi “Jesus Cristo”). Funciona também como hino doutrinário, pregando a paz em oposição à guerra (ou à luta pela liberdade?).
“Outro dia, um cabeludo falou: / ‘Não importam os motivos da guerra / A paz ainda é mais importante que eles.’ / Esta frase vive nos cabelos encaracolados / Das cucas maravilhosas / Mas se perdeu no labirinto / Dos pensamentos poluídos pela falta de amor. / Muita gente não ouviu porque não quis ouvir / Eles estão surdos!”
Faixa (2) "Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos"
A famosa composição de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, amplamente divulgada como uma canção de solidariedade ao colega Caetano Veloso, que tinha sido deportado pela Ditadura Militar no ano de 1969 e se encontrava no exílio, em Londres. Música politicamente engajada. (A canção perfeita, acima de qualquer suspeita).
“Um dia a areia branca / Seus pés irão tocar / E vai molhar seus cabelos / A água azul do mar / Janelas e portas vão se abrir / Pra ver você chegar / E ao se sentir em casa / Sorrindo vai chorar”
Faixa (3) “Se Eu Partir”
Canção bastante triste, numa cadência lenta e com letra marcante!
“Tudo vai mudar no dia que eu partir / Nada do que fomos vai sobreviver / Vou estar presente em sua solidão / ... / Frio e silencioso o quarto vai ficar / A lembrança morna vai provar que eu / Ainda sou tudo o que você desejou / ... / Foi tanto amor que eu dei e tanto vai durar / Minha lembrança vai fazer você chorar”
Faixa (4) “I Love You”
Música alegre e despretensiosa, bem ao estilo da jovem guarda; o cantor usa uma voz grossa e parece mesmo não ser Roberto Carlos.
“Eu queria um passarinho ser / Pra levar um bilhetinho pra você / E nas mal traçadas linhas revelar / Minha paixão e o meu amor, meu grande amor / No meu radinho de pilha sempre escuto / Melodias que me lembram de você / Cafonice talvez possa parecer / Vou me modernizar você vai ver / Uma calça Lee agora vou comprar / Vou ficar moderninho pra chuchu / Vou até aprender falar inglês / Pra lhe dizer: I love you, I love you”
Faixa (5) “De Tanto Amor”
(Uma confissão e tanto).
“Ah! Eu vim aqui amor só pra me despedir / E as últimas palavras desse nosso amor, você vai ter que ouvir / Me perdi de tanto amor, ah, eu enlouqueci / Ninguém podia amar assim e eu amei / E devo confessar, aí foi que eu errei”
Faixa (6) “Amada, Amante”
Música avançadinha e com apelo bastante sensual para a época (ano de 1971). Atraiu uma multidão de fãs. (Como é que a censura deixou passar essa?)
“Esse amor demais antigo / amor demais amigo / que de tanto amor viveu / que manteve acesa a chama / da verdade de quem ama / antes e depois do amor / e você amada amante / faz da vida um instante / ser demais para nós dois / esse amor sem preconceito / sem saber o que é direito / faz a suas próprias leis”
O disco “Roberto Carlos” do ano de 1971 foi um dos mais bem sucedidos de toda a carreira do cantor. Pelo menos cinco – “Detalhes”, “Amada Amante”, Como dois e dois”, “Todos estão surdos” e “Debaixo dos caracóis dos seus cabelos” – das doze faixas do long play foram hits de sucesso nas rádios; algumas delas recheiam, ainda hoje, o repertório de seus badalados shows – em terra firme ou em suntuosos transatlânticos.
Não, eu não acredito nessa hipótese.
Entretanto, trocado ou não nos anos da Ditadura Militar, Roberto Carlos é, sem sombra de dúvida, o mais famoso, popular e querido cantor brasileiro de todos os tempos. E o resto é lenda.

4 comentários

Poesia Retrô www.poesiaretro.blogspot.com

Oi. Sei que este link não é o espaço adequado para tratar o assunto, no entanto, fica aqui meu relato...

Não estou conseguindo acessar o link COMO COLABORAR

Jorge Xerxes

Para Bom Entendedor Meia Palavra Basta.

Abaixo Essa Lavagem Cerebral Que Nos Servem Todos os Anos!

andre albuquerque

Jorge: excelente. A partir dos anos 70 (específicamente 1973), a temática dos discos de fim de ano de RC, tornou-se tão -previsível quanto o tempo no Saara:erotismo ultra-light,família e religião.Acredito que influência do empresário (Marcos Lázaro), que considerou a postura ideal para manter um bom faturamento e que parece perdurar até hoje.O resto,fica por conta da lei da inércia,atuando sobre o artista e seu público.Quanto á "teoria conspiratória", considero literatura policial e das boas,com grande potencial para desenvolver um enredo .Grande abraço,André

andre albuquerque

Uma contribuição não solicitada á "teoria conspiratória": será que a única faixa 100% instrumental dos discos do RC,que eu conheço (O diamante cor de rosa ) seria obra do seu substituto ?Rs,rs,rs.Grande abraço,André