segunda-feira, 26 de novembro de 2012

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Crianças


Jurema agora deu para ser mãe mesmo. O nome dela é Carla, mas desde que nos casamos só consigo chamar de Jurema. É que Jurema ficou com uma cara de Jurema depois do casamento... E agora cara de mãe.

Não sei direito quando começou. Quer dizer, eu sei, foi com Gabriel. Aquela coisa, a barriga cresceu, tiramos mil fotos, gastamos uma fábula para decorar um quarto de criança, uma fábula em fralda, uma fábula em mil coisas que eu nem sei para que servem... Várias fábulas. E Gabriel estava ali, descascando o papel de parede e dormindo na nossa cama.

Lembro especialmente de uma noite em que dormir estava mais impossível que de costume. Em geral, eu sentia como se tentassem perfurar minhas costelas, ou como se chutassem minhas canelas. Era só Gabriel se mexendo. E como Gabriel se mexe! Mas nessa noite, sentia as duas coisas ao mesmo tempo: tentavam perfurar minhas costelas e ainda chutavam minhas canelas. Não sei descrever o que senti ao abrir os olhos, mas estavam lá Gabriel, Julia e Pedro.

Gabriel é o meu preferido, porque foi o primeiro e porque requer mais atenção, já que seu nome não é passível de diminutivos - como Pedrinho e Julinha. Mas Pedro é o mais inteligente. Outro dia, Jurema cismou de fazer purê de inhame. Nunca vi um cidadão que, por livre e espontânea vontade, comesse purê de inhame. Mas deixo rolar, Jurema que é a mãe e esse tipo de gente costuma saber o que faz. Pedro recusava-se a abrir a boca. Eu também, mas para mim havia lasanha congelada como opção. Baixou um troço na Jurema que ela falou com ele de uma forma que eu nunca a vi falar com ninguém. Lembro uma vez em que fomos assaltados, se ela falasse assim com o bandido, ele mudava de idéia sobre o assalto e ainda entrava para a igreja. Jurema disse a Pedrinho:

- Abre essa boca ou eu vou jogar seus brinquedos fora!

Mas disse endemonizada, transbordando cólera, de um jeito que só as mães conseguem. Fui para debaixo da mesa. Pedrinho olhava para a mãe e, longamente, para o purê de inhame. Olhava para a mãe e, longamente, para o purê de inhame. Então respondeu:

- Quais?

Sinceramente, não sei onde isso vai parar. Julia rabisca as paredes. Sinto falta de Carla. Também não sei mais quantos filhos temos - agora durmo no sofá.

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