quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

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O CARRO DO SOL 4 - JANDIRA ZANCHI



 
 
O CARRO DO SOL
4.

-              Não são pequenas as minhas dúvidas, Acássio. Consinto com o traçado da nave, condizente às cercanias da amplitude amarela da estrela, ascendida ao fulgor das mais nobres e espaçadas partículas.
-      E...
-              Por que ao chão foi largada a alma? Por que o deus se deu essa forma de osso e carne, resvalando às valas, entupindo-se de lodo, amarrado no poço das águas?
-              A forma que se funde é nobre, desde que escape do excessivo envolvimento com a sua sombra.
-              Ao te ver, perfeito, belo, condizente, aéreo, espaçado e livre no movimento, o consinto... mas, por que escapismo esqueceria as mil aves do coro cantado por inúmeras vozes, ardentes e frementes, tão firmadas nos seus hinos de amor e agonia? Como poderão reintegrar-se para assimilarem as compostas leis do sutil traçado da aérea oração?
-      Sou saído das nuvens do corcel de ouro e não contenho todas as respostas em meu centro. É mais fácil respirar em ar profundo, porém, as películas do líquido também permitem um tranqüilo navegar. Se de melhores sonhos... como discutir a validade do meio? É acompanhá-lo.
-      No que falhou a raça humana?
-              Também é produto do meio. Confronta-se em cadeia, espelho e consentimento para a adoração do belo.
-      São estágios.
-      Evidente. O homem é o deus em si, mas empunhá-lo é o longo processo da execução de si mesmo.
-      E começa-se pelo bailado dos arcos...
-              Não, antes, a alma é a sua primeira prenda. Pode sair-se inteira, divina, em ser de pouco enfeite e desfeito de elegância de movimento, impulsionado por febris arroubos de êxtase e humores viscosos. Os arcos apenas amoldam o composto de energia, ação e luz.
-       As estrelas azuis explodem ao próprio centro bem antes do tempo.
-      As amarelas se arranjam com tanta perfeição, que é bem longo o trajeto da fase principal.
-      Permitem-se a alucinação virtual de todos os seus arcos.
-      O fulgor do homem vai primeiro precisar deitar-se,  suave e longilíneo, ao longo de sua melhor forma e posição. Só então poderá a consciência traspassar a o infinito.
-      É tão sombria a tragédia do primata privado do cálice, bebendo as trombadas nas bordas, indeferido antes de fornecer-se.
-      Sim, machuca a alma a fera denegrindo-se de sua valia.
-      A você também?
-      A mim também – e a deus abaixou os olhos.
         Deixaram-se quietar por um longo silêncio. As estrelas socorriam-se brancas, todas formadas da mesma luz, mas quantas conseguiriam formar o benefício do núcleo? Era triste a métrica da marcha, que nunca deixava dúvidas de seu decorrer no espaço/tempo.
-              É como se fosse o transtorno de qualquer outra causa/efeito da vasta natureza cósmica – refletiu Mona.
-      Temo que sim.
-      Porém, toma a luz, em algum momento, ciência de si mesma.
-      É do que nunca se duvida. E o tempo não vai prejudicar a pureza desses gazes.
-      A entropia deita-se ao longo do solo, mas, a brandura da emissão é sempre a mesma.
-      Desde que se forneça o combustível.
-      Ele altera a vibração, não a composição.
-      A Era dos Aéreos Deuses é gaseificada, mas ainda assim munida da mesma alma.
-      Por que te consola o heróico?
-      Porque vive com intensidade.
-      E erra com virulência.
-              Triste cortejo. Já não deito as minhas dúvidas, antes, aspiro o perfume das nuvens.

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