Dorothy decidiu pegar a estrada antes do sol raiar. Nada
a impediria. Não hoje. Não agora. A maior parte da família e dos amigos foi
trabalhar na cidade. Tinha que aproveitar que a tia estava dormindo e o galo
ainda não tinha cantado... O ano estava quase terminando e o tempo se
esgotando!
Começou a jogar algumas roupas e calçados dentro
do mochilão. Não esqueceu do protetor solar e do repelente de insetos, nem de
levar as economias guardadas debaixo do colchão... Riu. O esconderijo era tão
óbvio que dificilmente um ladrão procuraria ali...
Pouco antes de sair e fechar a porta (com
todo o cuidado, para não acordar a tia!), pegou o porta-retrato da sala,
daquele Natal em que todos estavam reunidos, deixou um bilhete em cima da mesa
de jantar e se foi. Ainda deu uma última olhada para a casa, o jardim....
Sentiu um aperto no peito e os olhos marejarem quando lembrou das duas décadas
que passou ali, das boas lembranças e até das ruins, que a alquimia da vida
transformou em
aprendizado... Mas sua missão tinha acabado e ela precisava
seguir em frente...
Começou a caminhar pela Estrada Geral, onde
não tinha uma viva alma sequer! Ouvia nitidamente as suas botinas de trekking
pisando o chão batido, via os bois e vacas que dormiam, os cavalos... Um
vira-lata manco cruzou na sua frente, com o olhar suplicante para que não o
enxotasse, já acostumado com as pedradas da molecada, o pobre...
Enquanto caminhava resolutamente pela
estradinha interiorana, foi passando pelas terras dos vizinhos e se despediu
mentalmente das galinhas, dos patos, dos marrecos, dos porcos, dos gatos... O
piar da coruja a assusta por um momento, mas ela segue, rumo ao desconhecido. –
Não posso fraquejar agora, de jeito nenhum!, disse para si mesma.
Finalmente, depois de uma hora caminhando,
alcançou a estação do trem. Apressou o passo até o guichê. Olhou o quadro para
decidir qual destino escolheria.
– Bom dia! Quero uma passagem
para Esperança!
– O trem vai partir agora. Se
correr, você ainda pode pegar!”, alerta o bilheteiro. Ela corre e consegue embarcar
no último instante. Iria chegar à noite, a tempo de ver os festejos da chegada
de 2013! - Que venham os novos desafios!, murmurou Dorothy, enquanto fechava
lentamente os olhos e se preparava para cochilar. A jornada até ali tinha sido
árdua. Precisava recuperar as forças para encarar o novo ano...
Sônia Pillon é jornalista e escritora, nascida em Porto Alegre (RS) e radicada desde 1996 em Jaraguá do Sul (SC), Brasil.
Seja o primeiro a comentar:
Postar um comentário