quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

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O CARRO DO SOL 10 - JANDIRA ZANCHI




O CARRO DO SOL 
10.

         Senhora dos vales, por que te desagrada o brincar dessas partículas? Não faço conta de tua impassibilidade. É um jogo de contagem ou de resistência? Se te interessa, ganhar ou perder são contas de um colar e de uma nave. Não te desagrade, que desde o começo dos tempos entendeu o caos que sua ordem e felicidade eram o espaço e a liberdade, o flutuar sereno de suas partículas. Se te alivia o passar e o agravo do tempo... continue apostando nesses homens inferiores, que teus servos, pois não conseguem ensaiar o bailado da leveza.
        Quero orquestrá-la e conheço alguns grandes maestros. Somos brincadeiras e desaforos da matéria, seu desafogo. Esquecemos de condensar no ponto de reserva e passamos os dias organizando rebeldias e espiando por entre as frestas que te cobrem o ventre. Vomitarei a luz azul e loura todas as manhãs, porque entendo que se perfaz cento e mil e tantos pedaços de um desalinho até ombrear-se uma arte. Ainda não entendemos a 2ª lei da termodinâmica e, caso dela venhamos a tomar conhecimento, prometemos escapar-lhe por todos os espaços dos paraísos vizinhos. Aqui ficarás recordando os tantos malefícios.
-      Meu belo mago, meu coração já não recorda as condensações e impedimentos dessas criações que, equivocadas, aspiram consciência.
-      São contagens sem síntese, adorável menina – sorriu Acássio - que se permitem regressivas e, se cair por sobre os ombros dos humanos a continuidade do arquétipo, sempre se poderá consultar uma nova nave.
-      Algumas vezes fraquejo umas bobagens. Mas, saberei sentar-me no trono dourado dos deuses e freqüentar a vibração satisfeita do quietar do tempo. Que me importam o transcorrer e as dificuldades da matéria? Quando quiser, poderei me mover em pensamento ou em físico para vidas superiores, que paralelas, percorrem essa idiotice condensada.
-      Deixe que o Sol te cubra e, se te chamar o caos ou o vácuo, não de o melhor de si a eles, antes, reserve na ponta verde do anel do mago o perfume da criação.
-      Um dia a estrela saíra de sua faixa amarela e explodirá a força para tornar-se o gelo e o silêncio.
-      Outras nascerão. Nossas vozes e nossos passos percorrerão a órbita dos mais belos mundos.
-      Sempre poderemos percorrer as nuvens da inconsciência na sombra do vale. Assim poderemos emanar, em qualquer circunstância, luz e alegria.
-      A alegria em mim é tênue, se traduz em satisfação e rompimento com a desarmonia. Na sensualidade e na sensibilidade a flor azul é o perfume santo. A mente superior que nos engendrou tem os braços longos e a luz branca e sem vontades, acolhendo o guerreiro e o sábio na sua celebração.
-      Os maus vomitarão na montanha seus pecados e dificuldades. Caminharão sobre os pés até a calmaria da serpente que lhes beijou o anus.
-      Fenecem os que não se dão conta do breve percurso da mônada. Somos apenas contagem de tempo e adoradores do templo. As novidades e enfeites que trazemos não nos levam a ultrapassar esse limite. Muitas vezes nossas conquistas artísticas e científicas nos fazem esquecer nossa temporalidade. A virtual alucinação dos arcos, traspassada pelo vigor divino da natureza, poderá nos devolver a integridade da aura. Beba no cálice das primeiras e refinadas vibrações do raiar do dia. Ali se encontram todas as dádivas, as verdadeiras promessas, o grande elo da redenção. Renasce, incansavelmente, o milagre, porque só é vida o que se esquece e espelha no vôo do vento

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