quinta-feira, 4 de abril de 2013

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MIRAGEM: reflexo ou reflexão?



Miragem é o jogo de reflexos que liberta as palavras. Todo reflexo é ancorado no pensamento formado por devaneios. Segundo Pedro Du Bois, “O espelho reflete a imagem / Que tanto queria mostrar / Nos dias rasos / Em que sua vida / se esconde.”
O reflexo da imagem conduz a palavra espontânea ao poema instantâneo, ao som da voz do poeta em movimento na face da vida. A miragem de espelhos encantados, na luz transfigurada, reflete o cálido sopro, afligindo a sombra do próprio poeta.
Como entendemos o que vemos no espelho? Ficamos presos à imagem refletida? Márcia Maia no livro Espelhos, responde: “Vaga esperança / de / ficar // Existir. / Além de. // Apesar de. // Miragem refletida / por trás / do espelho / de todos os espelhos. / E são tantos...”
O reflexo, por muitas vezes, nos surpreende com a exatidão do gesto, como desejo que circula no coração do poeta e ao ser reconhecido desvenda o que há por trás do pensamento; na reflexão encontro o livro Espelho meu, de Belvedere Bruno “... Um espelho diante de mim parece inquirir sob meus sentimentos...” Procuramos a beleza na imagem porque fazemos parte de um mundo sem essência? A miragem é reflexo ou reflexão?
As perguntas resgatam o retrato emocionante e verdadeiro sobre os escritores que, enquanto poetas, são a miragem da linguagem enquanto reflexão. Ao produzir a obra nos construímos com os outros. Os escritores nos contaminam através das imagens, som e ritmo de palavras, aos se espelharem e se refletirem em suas obras. Eles, em seu processo criativo, expõem os sentimentos, como no livro Espelho Ardente, de Hugo Mund Júnior “... espelho / a miara / o impreciso / reflexo / de um narciso / a vogar.”
Através dos poemas entramos no jogo de espelhos, na promessa do significado que, em dado momento, se transforma em miragem e nos oferecem a palavra em sua dimensão significante, emergindo através do reflexo de outras palavras em outros sentidos e em continuados desdobramentos semânticos.
Helena Kolody teve a preocupação de movimentar as palavras, em seu livro Viagem no Espelho, que nos conduz a miragem dos poemas “Não sou a imagem no espelho / nem reflexo nos olhos alheios...”
E, conforme Maria Esther Maciel, “a prosa é agora o espelho da poesia,... donde lhe viria a luz, não fossem os espelhos?”

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