segunda-feira, 20 de maio de 2013

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Viagens - Capítulo III


Santa Catarina

Florianópolis é uma cidade que se vê e nunca mais se esquece. Estive lá muitas vezes. Mas, uma dessas vezes marcou em meu coração. Estava de passagem apenas. Seguia para uma cidade próxima, a trabalho. Era uma noite de janeiro e estava muito quente. No Sul do Brasil é assim. Em um dia está chovendo e o frio é insuportável, já no dia seguinte o calor é sufocante. Dizem que algumas vezes as quatro estações do ano transitam nas vinte e quatro horas de um dia.  Por estar calor, decidi dar uma olhada na praia que ficava em frente ao hotel, e segui caminhando lentamente pela areia suave. As ondas que iam e vinham, molhavam a orla com a deliciosa água a meus pés. Na caminhada distraída, encontrei uma garotinha morena que carregava uma panela velha nas mãos. Ela me pediu dinheiro. Achei que fosse boa a ocasião para uma conversa. Sentei-me na areia e a convidei para sentar-se a meu lado. Um tanto receosa ela acedeu ao convite, mas ficando a uma distância que eu não conseguisse tocá-la. Perguntei-lhe se era de Florianópolis, com quem morava, sua idade, e coisas assim. Respondia por monossílabos, ou no máximo um ‘sim senhora’ ou ‘não senhora’. Como fui insistindo na conversa, ela soltou o verbo e contou-me que morava com a madrasta e o pai, que a faziam ‘trabalhar’ na praia para garantir seu sustento. Falou que tinha um valor diário exigido por eles, e enquanto não obtivesse esse valor, não poderia voltar. Aquele era um dos dias que ainda não havia conseguido o suficiente para não apanhar quando chegasse. Após uma longa conversa, ela perguntou se eu a queria como filha. E seus olhinhos negros derramavam grossas lágrimas de medo, de dor e de infelicidade. Abracei a menina e pensei, gostaria muito que o mundo fosse diferente. Que crianças não fossem obrigadas a se prostituir para viver. Porque prostituição não é só vender o corpo, a maior delas é vender a dignidade e a confiança na vida. Em uma cidade tão linda, com um povo acolhedor e alegre, nunca pensei encontrar uma mancha de escuridão e tristeza nas areias brancas das praias.

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