sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

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SÔNIA PILLON - A CASA DA OMA

Os cheiros da minha infância me acompanham pela vida afora. Lembro como se fosse hoje do alto portão de tela e do longo corredor de cimento que conduzia até a porta da cozinha, o lugar mais procurado da casa. A casa de alvenaria era uma construção antiga, reformada a duras penas pelos meus avós maternos, que eu chamava carinhosamente de “oma” e “opa”. Mas, se faltava luxo e coisas supérfluas, sobrava simplicidade e aconchego na Porto Alegre de minha fase de menininha sonhadora...

Nos dias de sol, quando a cigarra e os pássaros cantavam, eu olhava e sentia o aroma e o colorido das rosas, sem pensar em as colher. Para que? Elas estavam ali, enfeitando o jardim e exalando cheiros que inebriavam e me faziam sonhar com um mundo mais lúdico, mais belo, menos frio... A elegância das orquídeas também não me passava despercebida.

Lembro bem que oma Clara tinha uma predileção especial por orquídeas, que ela cuidava com o maior esmero. Eram tão lindas, altivas e exuberantes, que mais de uma vez vi pessoas baterem palmas no portão na tentativa de que ela vendesse algumas, para presentear alguém...

Eu devia ter uns 11, 12 anos, sei lá... Ainda que fosse uma pré-adolescente, me sentia uma criança por dentro. Tinha a cachorrinha Bella, que fazia festa toda a vez que eu chegava e a acarinhava.  Na época, meu opa José, marceneiro aposentado, vivia às voltas com o galpão que fazia de oficina. Foi ali que eu me acostumei com o som das ferramentas e o cheiro da madeira. Quantas vezes ele me produziu brinquedos, pequenos móveis e objetos utilitários com suas mãos habilidosas e criatividade? Perdi a conta!

Na cozinha, que além da modernidade proporcionada pelo fogão a gás, um providencial fogão a lenha se mantinha perto da porta e garantia a calefação, nos dias mais rigorosos do inverno. Os aromas da comida caseira, dos doces e compotas são inesquecíveis, assim como a arte do bordado e do tricô desenvolvida por minha oma, dons que por mais que tenha tentado, nunca consegui desenvolver...

O legado de honestidade e ética deixado por eles me acompanha ao longo da vida e me faz sentir uma saudade muito grande. Reminiscências de um tempo que se foi para sempre, mas deixou doces marcas em mim.


E hoje, quando olho a mesa e a coluna em estilo clássico feitas por opa José, revitalizadas na minha sala de estar, uma sensação de felicidade me envolve. Há coisas na vida que não tem preço!

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