quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

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só o TEMPO, com o TEMPO

”Por ti / reinvento / o perfume das árvores.” (Fernando Aguiar)

Desde quando fui ensinada a refrear o tempo? Querendo ou não sinto a sua passagem. Como posso fazer de conta que ele não existe? Como ignorar o tempo ao me olhar no espelho? O certo é tentar conviver com ele e tirar vantagens. Mas, quais são as vantagens?
Ao ler, sinto-me espectadora do tempo, com a função de mudar historicamente. Participo da paisagem que se transforma quando reveladas as vantagens que só com o tempo poderei explicar. Pedro Du Bois argumenta que o “tempo é a nossa verdade, ele não nos pertence”, e que “há o tempo de plantar e o tempo de colher”..
O tempo reflete o comportamento e atinge os talentos da literatura, também articula e garante a presença dos escritores através das suas obras, com os efeitos de que só o tempo e com tempo viremos a saber da história.
Atualmente o mundo se comporta como imensa biblioteca onde tudo é reaproveitado, resignificado, reutilizado, repensado, reencontrado, recriado, reaprendido e tantos outros RE. Só o tempo cria, produz e se compromete com as palavras, e até se torna literatura quando nasce e se desenvolve em diferentes épocas e sociedades. Lise Maria Fank escreveu que “Ontem, / portas e tramelas, / latidos de guaipecas, / cautelas de antigamente. // Hoje, / portões eletrônicos, / cercas elétricas, / cães amestrados / e o medo de gente.”
Com o tempo vem a lembrança do que já vi e li. Amplio a ideia e, consequentemente, reinvento a história. Só o tempo mostra que o leitor percebe o reverso das palavras, como coloca Almandrade, “O / pré- / go / pre- / ga, / o / tempo / des / prega.”
Não esqueço o tempo porque o carrego nas mãos, nas relembranças, no ressignificado do desejo de criar, sem me subtrair à passagem entre os sentidos: sim e não, doce e amargo, autor e leitor, ator e espectador. Ousadamente, recarrego as ideias e as transformo com criatividade quando me aproprio da memória visual, sonora e textual, sob a condição de rever de outra forma a minha vida.
Quando reaproveito a ideia, tenho fatos para estampar na página e, assim, sobreviver no tempo do RE (alguma coisa), como força de expressão, onde só o tempo e com o tempo posso me libertar, como encontro em Clauder Arcanjo, “...Tudo se renova naquilo / Que nos encanta e espanta.”
Só o tempo é referência para a terra de boa literatura. Ele corresponde à necessidade social, onde as relações devem se caracterizar pelas normas entre autor, leitor versus a criação que os diferencia em traços específicos, como o tempo. A terra movida pela curiosidade, alegria, choros e amor que todos querem reler.
Reencontro em Dagmar Destêrro que “O tempo jamais nos espera // Não basta apenas viver; / É preciso sentir a vida / Em sua essência; / vivê-la em profundidade. / Analisar as pedras do caminho.../ Pensar com realidade //... Para não correr o risco / De ficar para trás / Alimentando fantasia.”


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