Caro
Akira,
Um
poeta lá de Cubatão, criou uma página chamada viver a vida como um poema, após ler os seus livros: Oliveira
Blues e Bentevi, Itaim, pude ver que embora não tenha nomeado tal
estilo de existir, você o pratica há muito tempo. Pois textos como Canção pequena para ninar um menino morto,
escrito em 1979, nos oferece a oportunidade de perceber que a sua poesia é
conduzida pelo movimento seja das pernas ou das rodas que carregam seu olhar
por paisagens e pessoas que para muitos são apenas mero pano de fundo, mas para
você são protagonistas que suas palavras tentam afagar, como quem por meio do
afeto descasca as máscaras e fantasias do social, devolvendo humanidade aos
meninos de rua ou apara dedo mole e nóias.
No
primeiro sarau da Casa Amarela, Arnaldo Afonso disse que há algo especial
naquele lugar, mas como o lugar é parte do ser, acho que entendo o que ele quis
dizer, pois na sua poesia obviamente que partindo da individualidade o caminho
só permite ser percorrido em companhia, a referência aos amigos é contínua,
você se dilui entre eles e ganha ao tornar-se múltiplo desde poemas dedicados
diretamente a eles como para João Caetano e Sacha Arcanjo ou em dedicatórias
para Escobar Franelas e Ronaldo Ferro, chama a atenção o movimento de criar
referências ao invés de recebê-las digeridas.
No
célebre poema de Poe, a renitência do corvo ao emitir never more, perde para o seu bem-te-vi, pois ao não cantar, ele
deixa o silêncio, herança do avô, ecoar e em nosso tempo onde a paisagem sonora
é ruidosa e ouvi-lo tem o mesmo efeito de um grito em meio à meditação de
monges.
Desde
o título a alguns poemas o bairro aparece em sua obra para além de descrições
geográficas, tornando não o lugar, mas as sensações obtidas por meio dele em sentimentos
universais, eu que sempre reclamei do gás da nitro, me recolho em minha
ignorância sensitiva.
O
tempo e os pássaros em ti, asas que querem abraçar o todo, paralisar os
ponteiros e os dígitos do relógio. A poesia que namora o cotidiano e antes de ser
transplantada para o papel, vive dentro dos sentidos e sentimentos do seu ser resistente,
que não permite ser domesticada pela estética vazia.
1 Comentário
Se beleza interior refletisse em beleza exterior o melhor trabalho de estética seria a prática do bem!
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