Fotografia por Roberto Candido
Luka Magalhães é analista de sistemas, pós-graduado em Planejamento de
Educação à distância, pela Universidade Federal Fluminense. Atualmente é editor
no selo Edições Archangelus, ele
também atua na equipe gestora da Casa Amarela - espaço cultural de São Miguel
Paulista. No campo artístico seu foco está nas artes cênicas tendo atuado e
dirigido a trupe Casa Amarela em cena, Luka
é fotógrafo. Na literatura já produziu
em diversos gêneros, desde textos teatrais, contos, fábulas, teorias literárias
e poesia. Alguns de seus escritos estão disponíveis no site Recanto das Letras
. Luka lançou no dia 23 de Junho, o livro de poemas intitulado Ecos do
silêncio, este é o tema do nosso bate-papo.
Luka, na entrevista que fiz com a
escritora Márcia Barbieri, perguntei a ela se é possível escrever o silêncio,
ela me respondeu o seguinte: É quase impossível presenciar o
silêncio... Todo escritor, no fundo, tem a intenção de escrever o silêncio, mas
o silêncio é divino, não é humano. Você está preparado para o fracasso com o tema escolhido para
o seu livro?
Vou
começar usando uma frase meio clichê – quem
não se prepara para o fracasso não reconhece a vitória. O fracasso é algo mais presente do que o
sucesso e creio que devemos estar preparados para falhar mais do que acertar. É
assim que aprendemos e crescemos.
Não
diria propriamente que o tema já tende ao fracasso. A Márcia acerta quando diz
que é quase impossível, mas na
própria frase dela entendemos que não é totalmente inatingível. O silêncio é
divino? Sim, mas precisa do humano para ser percebido e para ser compreendido.
Uma resenha sobre meu livro traz versos muito interessante sobre o silêncio:
Silêncio no
templo/ Após tocar o sino/ Compreendo o silêncio... (Alvaro Posselt)
(https://henriquevitorino.wordpress.com/2018/05/28/resenha-ecos-do-silencio/#more-276)
Há
um outro ponto a se pensar. Escrever o silêncio é diferente de escrever sobre,
e acredito que é um pouco distante de se provocar o silêncio por meio de
escritos. Muitos escritores conseguiram provocar
os leitores, de modo a surgir um silêncio, seja reflexivo ou não, nesta linha
intencional temos inúmeros escritores.
Se
estou preparado para o fracasso com o tema escolhido?? Acredito que meu maior
fracasso seria não tê-lo escrito.
Os poemas escritos por você possuem
uma linguagem concisa. Quais são os poetas com quem você dialoga sejam
elas/eles contemporâneos ou da tradição?
Meus
escritos sofrem muitas influências, o que acaba caracterizando o que poderia
ser meu estilo – se é que eu já tenha
um (risos) - Posso citar que, por conta
dessas influências, vejo um diálogo muito coerente com alguns poetas em
determinados textos.
Entendo
que há um diálogo com Pablo Neruda, principalmente pelas antíteses dele e por
textos que tem uma proximidade muito forte na mensagem transmitida.
Neruda
escreveu:
Gosto de ti quando calas porque estás como ausente./ Distante e dolorosa
como se tivesses morrido./ Uma palavra então, um sorriso bastam./ E eu estou
alegre, alegre de que não seja verdade...
Eu
digo:
Quando tua boca/ se fechar às
palavras,/ quando teu silencio/ cerrar na alma,/ quando tua voz não ecoar/ e o
vazio do som nascer,/ saiba que cada suspiro,/ respiro,/ cada balbuciar/ me
aviva/ .../ E sei que estas comigo.
Talvez
haja um diálogo com Fernando Pessoa, pela parte dos textos onde fujo do
material e transcendo às leis da física. Mas não sou muito convicto disso, da
mesma forma que falo sobre a influência de Neruda
Não sou o som/ ou o eco
incontido/.../ Não sou o grito/ na boca mantido/.../ Eu sou o silêncio,/ puro,/
simples/ e incômodo.
No primeiro poema do seu livro, é
dito ao leitor que seus versos são ouvidos, embora na parte estética não haja
um diálogo com a poesia concreta, tal possibilidade é perceptível na camada
sonora, ao lermos seus poemas em voz alta. Esta é uma característica da sua
poética?
É interessante pensarmos que meus
versos não são escritos/são ouvidos no anverso/ anteverso do som.
Não
diria que é minha característica poética. Pode ser a soma de todas as influências
literárias que tenho, desde Paio Soares de Taveirós, autor de Cantiga de garvaia ou Canção da Ribeirinha, marco do Trovadorismo galego-português, passando por
Dostoievski, Martins Pena, Ariano Suassuna, Augusto Boal e muitos outros.
Talvez
seja uma característica em construção, tentando fazer com que o leitor não
somente leia palavras, mas que busque entender
as entrelinhas e os subtextos. Que o leitor reflita sobre o que está lendo. E
isso não somente no que escrevo, mas também em outros autores.
O
leitor deve se ver dentro do que cada autor escreveu para entender, deve de
fato ouvir as palavras do autor.
Tal como a personagem de Água Viva, de Clarice Lispector, o
eu-lírico de Ecos do Silêncio, parece se dirigir a uma pessoa
amada de quem não recebe resposta, este talvez seja o fio condutor da obra.
Como se deu esta construção?
Quando
me propus a escrever Ecos do silêncio
tive como tema central abordar o silêncio em várias facetas, fugindo do significado
óbvio: a falta de som. Partindo disso, procurei inserir o eco em seus outros
sentidos, usá-lo como algo insistente, a reflexão não somente do som.
Tratei
de amores e sentimentos que insistem em existir.
Acho
que o direcionamento do eu-lírico para alguém partiu também de minhas
influências no Trovadorismo, estilo literário que me encanta há várias décadas.
Fernando Pessoa disse que sua
pátria era sua Língua, para este livro você escreveu poemas em Italiano, Espanhol
e Inglês. Como se dá a construção da expressão poética num idioma estrangeiro?
Há
ainda no livro dois dísticos, um em francês e outro em latim.
Tenho
dois momentos de construção poética nesses textos. Os textos em inglês e em
espanhol foram escritos nesses idiomas e depois os traduzi para nossa língua.
Os
demais parti de textos em português e procurei o idioma que mais harmonizasse
com o texto. Então tive experimentações de sonoridades.
Os poemas em Língua estrangeira são
seguidos pelas traduções, fale um pouco do processo de traduzir a si mesmo.
Traduzir
a sim mesmo é um desafio. Há a preocupação de que não possa haver o mesmo
encantamento em outro idioma. Quando a língua estrangeira se aproxima da nossa
temos uma noção, mas quando não, fica complicado.
Os
textos que passei para outras línguas foram experimentados. Um mesmo texto foi
transcrito para o italiano e para o francês. De ambas assumi a que mais trouxe
um encantamento sonoro, a que mais combinou.
Em
espanhol, En el cielo veio pronto
nesse idioma, pois há uma história familiar por trás dele
O verbo gritar aparece em diversos
poemas do livro. O grito é o antônimo do silêncio ou a extensão deste?
Depende
do momento. O grito rompe o silêncio mais rápido do que um sussurro e o
silêncio que vem depois de um grito acalma.
O
livro tem algo cíclico: som - eco - silêncio, seja qual tipo de som, seja como
o eco está representado, seja qual o silêncio. Acabam se tornando extensões,
sem um sentido obrigatório, podemos partir de qualquer um, que o outro aparece.
Você faz parte da comissão organizadora
dos eventos da Casa Amarela, o seu livro foi lançado pelo selo deste centro
cultural. Qual a influência deste local no seu fazer poético?
A
Casa Amarela é um celeiro cultural, onde aprendemos muito. Eu sempre cito o
dramaturgo russo Stanilavski, quando ela diz que devemos fazer a arte pela arte
e vejo isso na Casa amarela como verdadeiro, uma filosofia implícita. Lá é
possível entender como a arte que se pratica é vista por outras pessoas, por
outros artistas, diria que alguns de maior quilate do que outros, mas isso lá
não importa, pois arte é arte. Pude me ver sendo influenciado por décadas de
história cultural, com os monstros do Movimento Popular de Arte.
Apesar
de não me definir como poeta, pois sei que me desenvolvo melhor em outros
estilos literários, poder conviver com poetas de vários cantos, é enriquecedor,
pois vamos juntando tijolos poéticos e acabamos construindo muros bem mais
sólidos.
Você fotografa, produz vídeos, em
que estas outras linguagens influenciam a sua escrita?
Em
vários campos artísticos é necessária a concepção do que ser quer e como se
quer fazer.
Muitos
escritores são instintivos, escrevem de acordo com seus estímulos e suas
inspirações. Eu faço muito isso, mas parto de frases que me vem à cabeça e
escrevo algo, que pode ser bom ou não.
Durante
muito tempo fotografei festas de casamentos e coisas afins, no tempo do filme
de rolo caro, onde não podíamos errar. Deveríamos pensar antes de fotografar
alguns momentos da festa. Essa foi minha escola de fotografia. Hoje em dia com
as máquinas digitais, se a foto não sair boa deletamos.
Ao
escrever algo, eu visualizo como seria a imagem (foto) da poesia. Se estiver
fazendo prosa, visualizo um filme, assim tento ser coerente e ter noção do que
esperar dos textos.
Por que ler Ecos do silêncio?
Por
que ler Ecos do silêncio?
Porque
encanta, provoca reflexão.
Porque
é uma leitura suave que permite ao leitor, se tornar coautor nas reticências,
gritar no silêncio em branco das folhas.
É
um livro que precisa ser lido e relido e em cada nova leitura, novas nuances
surgem.
Por
que ler Ecos do silêncio?
Porque
a poesia precisa gritar para ecoar no silêncio das palavras.
1 Comentário
Excelente entrevista. Provocações e reflexões, levando o leitor por um campo de experimentos.
Parabéns Luka Magalhães
Parabéns Fernando Rocha
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