sábado, 21 de janeiro de 2023

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Jean Carlos.




Jean Carlos de tesoura em punho pôs-se em prestativa arrogância a cortar os papéis vermelhos em pequenos quadrados perfilando-os, de dez em dez a sua frente.  O corte da tesoura, meio cega, proporcionava aos lábios que, de vez em quando, expressasse um sonoro, puta que pariu ao ver o papel mastigado. A intimidade que ele tinha com a tesoura era zero. Tesoura é coisa de mulher, dizia. No entanto, por motivo alheio, cortava os papéis quadrados amontoando-os de dez em dez. Em seu íntimo achava aquilo um castigo, penalidade que não sabia qual e por que.  Silenciosos os olhos verdes claros, deslizaram longamente em torno de si para constatar que estava sozinho. Cortou os papéis vermelhos, eram os últimos, separando-os dos outros.

Jean Carlos depositou a tesoura em cima da mesa. Olhou os papéis cuidadosamente cortados e, amontoados em pilhas de dez em dez. Marcava o relógio a sua frente, onze horas e trinta minutos. O que deveria fazer agora?

Jean Carlos num impulso repentino, com a tesoura, rasgou a barriga profundamente. Quando o acharam, o corpo boiava numa enorme poça de sangue. Dos seus lábios exíguos, o sorriso se expandia na alegria da morte. Foi decretado luto oficial por cinco dias em sua cidade natal.
Jean Carlos anunciou o destino de cada um que prantearam na quietude das velas acesas. Na rua o vento carregava as últimas folhas de papel vermelho que ainda faltavam para serem cortados.

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