Pregava a madeira que, por determinação dela, queria por que queria que fosse
colocada ao lado do quadro que, por ele, jogaria no lixo. Cada martelada na
cabeça chata do prego repercutia no cérebro, pequenas vibrações parecendo fios
finíssimos de cristal a se espedaçar em todas as direções. Ao perguntarem o do
porque ter feito aquilo, seu rosto mostrava indignação sem saber, foi o que
notificaram, e nem porque estava na sua casa pregando a madeira todo sujo de
sangue. Não soube e, veria, a saber, pois, o que dissera foi demonstrativo de
que sua mente não mais possuía a flexibilidade normal.
Pregava a madeira que, por determinação dela, e
que falava mais que matraca em noite de procissão, se surpreendeu ao ver o
martelo em sua mão manchado de sangue. Olhou para a roupa também suja de
sangue. Horrorizou-se, quase desmaiou, contou o policial relatando o que ele
lhe dissera. É não sabia dizer nem porque estava pregando a madeira quanto
muito o martelo manchado de sangue em sua mão.
Pregava a madeira, claro que pregava, pregava
também os finíssimos fios de cristais em cada canto do cérebro. Queria tirar os
cristais da cabeça, não conseguia. Contou para o policial que o martelo caíra
no dedo dela. Se tivesse arrancado os cristais da cabeça à coisa teria sido
diferente. Será? Perguntou dentro de um sorriso que ele somente conseguiu
decifrar. Olhava para o martelo indo e vindo, entrando e saindo do seu campo de
visão. Como seria se eu mudasse a direção do martelo? Acabaria com esses
cristais finíssimos espetando a cabeça? E quando percebeu, se é que tinha
noção, o martelo com toda a força esmigalhou o dedo da mulher. Os vizinhos
tinham ouvido um grito aterrorizado de dor, um grito que cortou a tarde como um
estrondo anunciando chuva. Assim que a noticia varreu os lados da casa, ninguém
acreditava.
Dona Júlia, mulher de seus quarenta e poucos
anos, foi quem chamou a polícia. Todos os dias ela vai às compras. Às vezes
demorava mais do que o costume, mas aquele dia deu faniquito nela, conforme
suas palavras anotadas pelo policial em seu relatório. Até denominou aquele dia
como o dia do faniquito. Não havia terminado de percorrer todo o supermercado,
quando estava na caixa registradora com o carrinho pela metade, foi movida pela
urgência de ir para casa. E todo o dia passava em frente à casa dos Marteli, e
quase sempre, parava para bater um papo com a Senhora Marteli. Eram amigas mais
de dez anos, quer dizer, se conheciam a mais de dez anos. A amizade delas não
ultrapassava a porta de entrada. Como dizia seu filho: amizade de porta de rua.
Realmente, antes daquele dia Dona Júlia nunca entrou na casa deles. Caminhava
intrigada diante a angústia ou aflição, não sabia como definir. Distraída,
assustou-se ao ver o senhor Marteli sentado na porta da casa, falando sozinho,
e com a roupa manchada de vermelho. Medrosa, perguntou o que houve, ao que o
senhor Marteli disse que estava tudo acabado, não ouvia mais os cristais se
partindo. Dona Julia perguntou pela senhora Marteli. Com o olhar vidrado num
ponto além dela, o que fez com que por duas vezes, olhasse para traz, respondeu
que a senhora Marteli agora estava dormindo, que não fizesse barulho para não
acordá-la. A porta estava meio aberta, portanto Dona Julia ao divisar o olhar
pela porta reparou que a senhora Marteli estava caída no meio da sala.
Não ligando para o homem sentado à porta, entrou sendo seguida por ele
que não parava de dizer que os cristais não estavam mais se quebrando e, que a
senhora Marteli não iria mais falar como gostava, ela estava dormindo.
Pronunciava o dormindo num sussurro que mal dava para ouvir.
Os policiais não tiveram muito trabalho, ao
chegarem encontraram o senhor Marteli conversando com a Dona Julia como se nada
tivesse acontecido. Explicava como os cristais deixaram de vibrar em sua mente.
Agora há uma paz silenciosa, disse ao policial que cruzou os braços dele atrás
das costas para algemá-lo. Dona Julia não deixou, disse que não precisava,
apesar de tudo era um homem calmo, não oferecia perigo. O policial olhou para o
seu superior concordando com Dona Julia.
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