sábado, 2 de abril de 2011

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O abandono


Eu sou João. Mas se olho no espelho, a imagem que vejo é aquela do demônio. A besta fera de sete cabeças, as bocas cheias de grandes dentes pontiagudos. A dor é imensa. A baba escorre pegadiça de minhas bocas. A dor é intensa. Os globos vermelhos saltam de minhas órbitas. A dor é insana. Sou meu próprio labirinto aqui na ilha de Patmos. Para descer de onde estou - para dentro de mim - percorro uma miríade de escadas através de nuvens, repleta de bifurcações. Sigo passagens por entre estranhas formações de vapor. São as minhas próprias entranhas. Essa é a única mística na qual ainda acredito. No passado dessas paragens - que agora nada mais dizem - um estrangulamento do tempo colapsou o eterno porvir, naquele que é. Observo a noite. Observo as estrelas. São tão belas! Mas estão ausentes. Por que nos abandonaste? São inextricáveis possibilidades de seres. Desdobramentos da existência. E não adianta lutar: habita-me o devaneio. Um remoinho sobre minha cabeça. (Não eram sete?)

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