quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

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LUNA 10 - JANDIRA ZANCHI



O CARRO DO SOL  -  LUNA 
10.

      Na manhã seguinte Mona acompanhou Alado em algumas visitas. Todas as residências pareceram-lhe maravilhosas e todos seus habitantes seres vindos de uma era primeva, com olhos amendoados e uma sombria – diria perigosa – emanação de suas auras. O reino resplandecia em ardente luz laranja, mas, ainda assim, ela não se convencia.
- Quando cheguei juraria que aqui só restavam energias, espíritos...
- Talvez...
- Não procure me assustar.
- Assustar? – e ele lhe dirigiu um olhar realmente assustador.
- Não vem ao caso. Uma matriz não deveria se assemelhar mais a um corpo denso, negro, com um cenário movido a estrelas e floresta cerrada?
- Quando o objetivo da mônada é o controle e o poder material e/ou espiritual, sim. Mas, para o controle do físico, do corpo material, para o poder sobre os seres da natureza, para a ação e execução, você precisa aprender a mover-se com segurança em campo aberto, em meio ao povo, sem redomas. O chão, os seres e os desafios serão teus parâmetros. Permita-se um planalto – físico e mental – aonde possa sossegar e observar, talvez sonhar e, principalmente, adquirir benevolência e sabedoria. Mas, nunca vai poder se afastar do campo da ação sob pena de fragilizar-se.
- Devem estar equivocados sobre mim em meu reino. Sou uma poeta, sonhadora, amo as noites luxuriosas e também as esquálidas, sem viço, arrancadas do ventre e da lua. Não me importo de mover-me em terreno de outrem para isso. Esse dormitório/observatório é muito arejado, ameaçador e fulminante de claridade.
- Minhas noites são doces, porém – ele sorriu.
- Nunca me encontrei em uma tão ardente e também tão suave...
- Só guerreiros fazem noites assim – insinuou-se.
- Alado...
       Ele sorriu e tocou-lhe a mão. Novamente Mona ficou confusa, distraiu-se, sentiu-se no cenário apenas com ele, era como se retornasse a algum ponto do passado, em um lugar desabitado. Depois,  ao lado dele, perguntou-lhe:
- Já nos conhecemos?
       Alado fez um leve gesto de assentimento e, então, ele lhe pareceu, por momentos, muito mais jovem, uma breve mudança de cenário, um tempo ainda mais anterior.
        Mona não saberia precisar o tempo em que ficarão de mãos dadas. Quando deu por si era noite, estrelas se chegavam mais próximas, um calor agradável percorria a laje em que estavam sentados.
- Pois bem – ele continuava de algum ponto da conversa - o meio e os homens fazem escolhas de boa sucessão. Essa tua boa alma deve ter conquistado os ascetas de teu reino.
- Eles têm muita paciência.
- Eu sou tua matriz, mas não sou você. Teu processo de individuação vai indicar um estar. É um processo, um conhecimento e uma adaptação.
- Também uma aceitação.
- Para recuperar a integridade de tua alma e força precisa, primeiro, entregar-se à matriz.
- Literalmente?
- Intensamente. Esqueça nossas diferenças. Você é nascida de mim ou, melhor, somos nascidos do mesmo parto.
- Você me reestrutura?
- Eu te devolvo a irradiação. Esses anos de clausura e neblina aprimoraram o verbo e a poesia de tua alma, mas, não foram benéficos para tua alegria e desenvoltura.
- Sei que procuro um porto, uma legislação, um lar, um amanhecer que se configure como a luz em minha terra.
- E tua terra aceita amanhecer em você.
- Pois então é isso mesmo?
- É, Mona, pelo menos por alguns dias, distraia-se da lua.
- Mesmo que o sol tenha me gerado em sua mais ímpia nascente, Alado, sou amante da noite e senhora da lua porque me segredou suas preces.
- Pois bem, minha bela, saberei fazer noites de púrpura e ouro para você.

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